domingo, 23 de dezembro de 2012

Filme: A Invenção de Hugo Cabret – considerações

Há este filme A Invenção de Hugo Cabret, dirigido por Martin Scorsese. Teve considerável bilheteria em 2011 e a crítica geral o avaliou positivamente. É possível obter algumas opiniões a respeito em sites voltados para o entretenimento... Podemos notar que as pessoas que acessam as dicas, e dão opiniões a respeito de filmes, recomendam A Invenção de Hugo Cabret... Há, inclusive, quem o considere “o melhor filme de 2011”.
Assisti ao filme nesta última semana... Podemos dizer que as partes técnicas (como os efeitos e cenários que reproduzem a época), além das interpretações, estão muito boas... Mas as pessoas que leram o livro de Selznick talvez não sejam tão generosas em suas avaliações sobre o filme... Muitos dirão que os filmes são “releituras” e não têm como interesse final a reprodução do texto em que se baseiam...
Polêmica à parte, devemos levar em conta que, no geral, o pessoal entendeu o filme como grande homenagem a Méliès e ao cinema do começo do século XX.
Então vamos indicar o filme, vamos indicar o livro... Vamos estabelecer relações e comparações. Ambos suscitam pesquisas... Isso tudo faz parte. Livro e filme tornam-se objetos de estudo. Por que não? Você que apenas assistiu ao filme, leia o livro... O outro, que apenas leu, procure o filme.
Não há como não destacar aqui algumas observações que levam em conta detalhes que sobressaem da comparação entre os resultados (versões fictícias daqueles acontecimentos que marcaram a vida de Georges Méliès em 1931) dos dois gêneros... É claro que este blog tratou do livro e "resenhou" seu enredo, então, de certa forma, a checagem de informações neste caso é mais fácil (preferencialmente ler o livro)... Sobre o filme, apenas algumas considerações. Então, o mais indicado é assisti-lo.
No filme vemos o inspetor da estação contar com um cão enorme e feroz (Maximilian) no combate aos maltrapilhos, larápios e órfãos que circulam pelo ambiente; o homem é retratado como um tipo atrapalhado (também devido a um aparelho que carrega junto à perna; há um momento em que é arrastado por uma composição ferroviária) e apaixonado por uma florista da estação.
O livro leva-nos a imaginar um inspetor severo e disciplinado em seu ofício (é bem verdade que o filme também deixa a mesma impressão), mas nele não há nenhuma referência à florista ou ao aparelho ortopédico. O filme mostra o inspetor trocando ideias com um dos agentes policiais sobre a vida conjugal deste; no livro não há esse diálogo.
Na história narrada por Selznick, o inspetor invadiu os aposentos utilizados por Hugo no momento em que o garoto recolhia o autômato para levar até Méliès... O menino, que estava com a mão direita machucada, não suportou o ataque físico do inspetor e o boneco mecânico caiu... Vemos inspetor espantado com o objeto e (mais tarde) também com a explicação que Hugo deu sobre o seu cotidiano nos ajustes dos relógios da estação... Na versão cinematográfica, o menino não sofreu nenhum machucado na mão e, quando foi descoberto e perseguido pelo inspetor, correu pela estação com o autômato até cair nos trilhos.
No livro, a senhora Emille (dona do café) e o senhor Frick (jornaleiro) são fundamentais para a revelação dos furtos e atividades secretas de Hugo pelos relógios da estação. Não notamos isso no filme... Também a fantasia (que no livro aparece sustentada por Emille) em torno da morte de Claude e seu fantasma foi desprezada pelo filme.
O personagem Etienne inexiste no filme... Este amigo da pequena Isabelle só aparece no livro. Sabemos que ele foi fundamental na trama. Ele possibilitou o acesso de Hugo à biblioteca da Academia de Cinema e o contato com o professor Tabard.
O texto “constrói” um órfão inteligente e determinado, mas também (não fosse pela amizade de Isabelle) quase abandonado à própria sorte... Maltrapilho e faminto, o menino é descrito como mal vestido e sujo (também por isso não recebeu autorização da senhora Maurier para utilizar a biblioteca da Academia de Cinema). Somado a isso, o machucado na mão direita completa um quadro digno de piedade daquele que sofre de dores... Certamente a imagem que temos do menino Cabret revelada pelo filme não é a mesma.
O filme mostra Hugo com a habilidade de abrir fechaduras com um grampo... É dessa forma que ele escapa da cela do gabinete do inspetor... Mas não é assim no livro. Hugo não tem a referida habilidade, e na ocasião citada aguardou com angústia até que a grade fosse novamente aberta para poder fugir... O texto de Selznick atribui a Isabelle essa arte de “destravar os trincos”. Para a surpresa de Hugo, ela faz isso em vários momentos (inclusive revelando o baú onde estavam os vários desenhos de Georges Méliès)... O livro apresenta uma garota autônoma, muito inteligente e cheia de iniciativas.

A cena em que Hugo segue Georges à noite, atravessando o cemitério retrata bem o que imaginamos quando lemos o livro... Mas não entendi por que o filme elimina as reclamações de Méliès contra as batidas das solas dos sapatos de Hugo no piso... Isso instigaria as pessoas a conhecerem um pouco de sua biografia.
Também não seria demais o filme explorar um pouco das referências à mitologia grega que aparecem no livro. O filme mostra de relance a pintura do Prometeu na Academia de Cinema, mas não promove nenhuma reflexão sobre a mesma... As condições existenciais de Hugo e Georges Méliès são tão bem “alinhavadas” pelo texto que acabamos esperando o mesmo do filme.
Indicação (livre)
Um abraço,
Prof.Gilberto

Páginas