domingo, 16 de dezembro de 2012

“O Queijo e os Vermes”, de Carlo Ginzburg – Menocchio explica sua cosmogonia; o interrogatório o leva a explicar Deus e a origem de tudo o que há no mundo

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2012/12/o-queijo-e-os-vermes-de-carlo-ginzburg.html antes de ler esta postagem:

O inquisidor quis esclarecimentos a respeito da cosmogonia de Menocchio antes que pudesse concluir o processo... Assim, a confusão de ideias manifestada pelo moleiro foi o foco do interrogatório que se deu a 12 de maio de 1584.
A primeira questão foi relativa à contradição do moleiro, que em determinada resposta havia declarado a coexistência Deus-caos, mas em outra havia dito que Deus tinha surgido do caos... Em resposta a isso, Menocchio disse que Deus é eterno com o caos, ”mas não conhecia a si próprio e nem era vivo”... Tendo depois “se conhecido”, Deus teria “sido feito do caos”.
Outra questão era sobre a informação de Menocchio sobre Deus ser dotado de intelecto... Então, como é que de início não conhecia a si mesmo? O que fez com que passasse a se conhecer? O que fez com que Ele se tornasse vivo? O interrogado disse que, com Deus, ocorreu o que acontece a todas as coisas de nosso mundo que vão da imperfeição, e/ou estágio simplificado, a uma condição perfeita e mais complexa... Como exemplo, citou a passagem das crianças da condição pré-natal (quando não compreendem a vida) para a de nascidas e aptas ao crescimento e à compreensão das coisas.
A partir dessa resposta, o inquisidor quis saber se esse intelecto divino conhecia todas as coisas e seus detalhes... Menocchio disse que sim, havia o conhecimento de todas as coisas que deveriam ser feitas, e que sabia do homem, mas sem conhecer todos os que nasceriam a partir deste... E deu o exemplo dos pastores que sabem de quais animais de seu rebanho nascerão outros, mas não sabem nada a respeito dos que nascerão... Portanto, admitiu Menocchio, “Deus via tudo” sem saber maiores detalhes do que ainda estava por ocorrer.
Então o inquisidor perguntou de onde o “intelecto divino”, que tinha conhecimento de todas as coisas, teria recebido tais informações... De sua própria essência ou de outra parte? Menocchio respondeu que era o caos que transmitia o conhecimento... Nele todas as coisas estavam confundidas... Mas na sequência esse “intelecto divino” recebeu ordem e compreensão do caos... Aos poucos, tudo (ar, terra, água e fogo) pôde ser distinguido.
Perguntado se Deus não possuía vontade e poder antes que fizesse todas as coisas, Menocchio falou que, em Deus, vontade e poder cresciam na medida em que (Nele) crescia o conhecimento... Depois dessa afirmação, ele explicou que poder e querer são distintos. E exemplificou com situações práticas de nossa existência (o caso do carpinteiro que pretende fazer um banco e que, para isso, precisa de instrumentos e madeira, pois, sem isso, sua vontade é inútil). Sintetizou dizendo que, além do querer, é preciso poder... E assim também é com Deus.
O “poder de Deus”, de acordo com Menocchio, manifestava-se na sua condição de “operar através de trabalhadores”... O inquisidor entendeu que esses “trabalhadores” seriam os anjos, mas perguntou se eles teriam sido feitos por Deus... Menocchio respondeu que eles foram feitos pela natureza, da “mais perfeita substância do mundo”, “assim como os vermes nascem do queijo”... Deus os abençoou e eles “receberam vontade, intelecto e memória de Deus”... E (perguntado que foi) Menocchio completou que Deus poderia ter feito todas as coisas sozinho, mas contou com a ajuda dos anjos e (assim como aquele que sabe construir sua casa recebe o auxílio de ajudantes) tudo se fez em menos tempo.
O inquisidor quis saber se Deus teria feito tudo o que há no mundo se não tivesse existido a substância que deu origem aos anjos... Menocchio respondeu que Deus nada faria se não existisse matéria... Ele ainda teve de explicar sobre a natureza e essência de Deus em relação ao “espírito ou anjo supremo” (o Espírito Santo)... Então, como que a estabelecer uma hierarquia, Menocchio seguiu dizendo que a substância de Deus é a mais perfeita, embora os anjos sejam provenientes da mesma essência... Deus é a luz mais perfeita, e sua substância não é a mesma do Espírito Santo... Cristo é de substância inferior em relação a Deus e ao Espírito Santo... Com essas afirmações, e indagado que foi, Menocchio explicou ainda qual das entidades era a mais poderosa.
Por último vemos o inquisidor perguntando se Menocchio podia explicar se Deus foi feito ou produzido por alguém... Ele respondeu que Deus não foi produzido por outros, mas seu movimento se deve às mudanças do caos, e ocorre da imperfeição para a perfeição... Então, o que move o caos? Menocchio garantiu que ele se move sozinho.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/01/o-queijo-e-os-vermes-de-carlo-ginzburg.html
Leia: O Queijo e os Vermes. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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