Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/06/o-queijo-e-os-vermes-de-carlo-ginzburg_6953.html
antes de ler esta postagem:
Menocchio foi
denunciado novamente... Em várias localidades da região (de Aviano a Pordenone)
comentavam as suas blasfêmias. O inquisidor interrogou um taverneiro conhecido
como Pignol (seu nome era Michele del Turco) e ficou sabendo das provocações do
moleiro, que insistia em falar a respeito de suas máximas em relação a
Cristo... Pignol contou que há uns oito anos disseram-lhe que Menocchio teria
dito que “se Cristo fosse Deus, teria sido um (...), deixando que o metessem na
cruz”... O taverneiro se disse indignado porque o acusado considerava Cristo um
frouxo... Pignol arrematou dizendo que o achava “pior que um turco”.
Essa situação revela que a condição e má fama de Menocchio haviam
piorado... Suas ofensas à religião ultrapassavam os limites da pequena
Montereale... Palavras ditas muitos anos antes eram repetidas e repercutidas...
Suas ofensas à divindade de Cristo incluíam também sua opinião em relação ao caráter
de Maria Santíssima... O moleiro a considerava uma prostituta. Para ele, a
concepção do Salvador do mundo nada tinha a ver com o Espírito Santo.
Menocchio andou anunciando
que São Cristóvão, que “carregou o mundo inteiro nas costas” devia ser maior
que Deus. Sobre essa última consideração, Ginzburg revela que a alegoria pode
ser conferida em livro que certamente o moleiro jamais tivera acesso, “uma
coletânea de símbolos, repleta de insinuações heterodoxas, do humanista
bolonhês Achille Bocchi”.
Zannuto Fasseta di Montereale, e também Daniel
Jacomel, foram chamados a falar sobre Menocchio. Jacomel disse que numa certa
ocasião, quando voltava de Menins com o investigado, este perguntou-lhe o que
ele pensava sobre Deus... Revelou que, como não tinha nenhuma opinião a
respeito, ouviu Menocchio explicar que Deus “não é nada mais que o ar”... E
mais, contou que Menocchio tinha opinião formada a respeito da ignorância a que
o povo estava submetido, e que garantia que os inquisidores não tinham nenhum
interesse em revelar às pessoas comuns o que eles sabiam. Jacomel deu a
entender que o moleiro era destemido, pois teria dito que “gostaria de dizer
quatro palavras do Pater Noster
diante do inquisidor, e ver o que ele diria e responderia”.
No fim de 1599 Menocchio foi preso novamente. Inicialmente no cárcere de
Aviano... Depois foi mandado para Portogruaro... No dia 12 de julho foi
interrogado por Gerolamo Asteo, o inquisidor, e pelo vigário de Concordia
(Valerio Trapola) e o magistrado Pietro Zane.
Menocchio contava 67 anos... Trajava-se como moleiro (túnica e gorro
cinza claro)... Fazia 15 anos que ele havia sido interrogado pela primeira vez.
Como sabemos, passou três sofridos anos na prisão. Estava velho. Havia exercido
profissões diversas depois que saiu da prisão (marceneiro, moleiro, hospedeiro,
professor e tocador de violão em festas). Apresentava barba e cabelos
grisalhos... Perguntado se já havia sido interrogado pelo Santo Ofício
anteriormente, respondeu que havia sido chamado para tratar a respeito do “Credo
e outras fantasias” que lhe passavam “pela cabeça por ter lido a Bíblia e por
ter inteligência aguçada”... Garantia que permanecia cristão como sempre havia
sido durante toda a vida.
O moleiro explicou-se sobre o cumprimento de
suas práticas e confissões regulares... Afirmou que comungava costumeiramente e
que só deixou Montereale porque recebera autorização dos inquisidores... Pediu
desculpa por não usar regularmente o hábito... Ressaltou que o usava às vezes,
principalmente nos dias mais frios (por baixo da roupa)... Explicou que o uso
frequente do hábito prejudicava o próprio sustento, já que as demais pessoas
relacionavam aquela vestimenta ao “crime religioso”, sendo assim, afastavam-se
dele porque o consideravam um excomungado.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/08/o-queijo-e-os-vermes-de-carlo-ginzburg.html
Leia: O Queijo e os Vermes. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto