sábado, 17 de agosto de 2013

“O Queijo e os Vermes”, de Carlo Ginzburg – cultura popular e “imbricamentos” com a cultura dominante; Pieter Bruegel e sua interação; exigências do Santo Ofício de Roma em relação ao caso Menocchio

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/08/o-queijo-e-os-vermes-de-carlo-ginzburg_3886.html antes de ler esta postagem:

Do que estamos estudando, somos tentados a imaginar que as “tendências que nortearam a cultura camponesa” em tempos pré-revolução industrial são resultado da difusão proporcionada por elementos específicos que pertenciam às classes dominantes... Há um erro aí, e discuti-lo implica tratar das relações que “permeavam as duas culturas (de dominantes e subalternos) naquele período”... Há a dificuldade natural própria da tradição oral em relação às pistas, muitas delas distorcidas...
Os documentos são raros e o caso específico de Menocchio é, sem dúvida, uma raridade. Os registros evidenciam que grande parte da “alta cultura europeia”, medieval e pós-industrial, tem raízes populares... “Trocas subterrâneas” entre os dois estratos ocorriam... Ginzburg destaca que Rabelais e Bruegel não teriam sido “exceções notáveis”.

                                                                           (Pieter Bruegel, pintor dos Países Baixos durante o século XVI, “misturou-se” aos camponeses e seu cotidiano; registrou em suas telas vários episódios da vivência campesina).

Já o período posterior a essa época é marcado não só pela distinção entre as culturas da classe dominante e de artesãos e camponeses, mas também pela “doutrinação das massas populares, vinda de cima”.
Na segunda metade do século XVI ocorreu a ruptura evidenciada anteriormente. A “revolução dos preços” e a “guerra dos camponeses e o reino anabatista de Münster” estão no contexto em que se nota a “intensificação das diferenças sociais”... Vê-se que as classes dominantes se depararam com a necessidade de retomar o controle (ainda que ideologicamente) das massas subalternas, que escapavam de sua influência... Mas isso se realizou sem a intenção de integrar... A ideia sempre foi a de manter o distanciamento social.
A obra dos jesuítas, e também a organização religiosa com a atenção voltada para as estruturas familiares empreendida pelos protestantes, são típicos dos esforços para que a hegemonia dominante fosse retomada... A repressão, processos contra a bruxaria e controle de grupos marginais (como vagabundos e ciganos) fizeram parte dessa repressão... “O caso de Menocchio se insere nesse quadro de repressão e tentativa de extinção da cultura popular”, destaca O Queijo e os Vermes. É a este caso que precisamos retornar.
(...)
Menocchio foi torturado... Condenado...
Mas o processo demorou a ser totalmente encerrado.
Aconteceu que os depoimentos contra ele se acumulavam de tal modo que o inquisidor de Aquileia e Concordia decidiu comunicar ao Santo Ofício em Roma sobre o caso.
O cardeal de Santa Severina respondeu exigindo que o processado fosse encaminhado imediatamente ao cárcere por seu caso tratar-se de evento extremamente grave... A autoridade esclareceu que os livros e escritos de Menocchio deveriam ser confiscados... Essa resposta deu-se a 5 de junho de 1599...
O inquisidor da região do Friuli resolveu enviar cópia de outras três denúncias contra o ”moleiro de Montereale”... No dia 14 de agosto, o cardeal de Santa Severina remeteu nova carta na qual disparou a sua fúria contra o réu, que ele definiu como “relapso” e ateu... Exigiu a aplicação de todos os recursos para que nomes de cúmplices fossem obtidos... Definiu o caso como gravíssimo e exigiu também cópia do processo, ou pelo menos “um sumário”.
Leia: O Queijo e os Vermes. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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