Depois de eliminar Soeiro e Simões, e de ter certeza de que Loredano não lhe escaparia, Peri calculou que seu plano enfim poderia dar certo... Considerou que os aventureiros já estivessem despertos e que isso frustraria os atentados que os aliados do italiano deveriam executar... O índio entendeu que era momento de esclarecer d. Antônio sobre tudo o que havia ocorrido e se dirigiu até ele.
(...)
Loredano saiu ferido do quarto de Cecília disposto a chegar ao fundo da
casa para gritar a senha, provocar um grande tumulto... Depois pretendia raptar
a donzela e vingar-se de Peri... Ele não sabia que o índio havia desmantelado
toda a sua trama... A decepção que teve foi intensa ao notar que todos os aventureiros
estavam acordados no alpendre totalmente iluminado... Viu também o cadáver de
Bento Simões sobre o chão completamente alagado. Os homens observavam que o
infeliz havia sido vítima de violento estrangulamento... De sua parte, o
italiano procurou avistar Soeiro... E sua angústia aumentou... Algo lhe dizia
que estava perdido, e que os dois cúmplices haviam sido terrivelmente punidos
pela Providência Divina (como eles mesmos temiam).
Mas, articulado como era,
não demorou a tramar uma reversão da situação que lhe pesava negativamente... Ele
percebeu o espanto e a indignação dos companheiros ante o estrangulado
Simões... Viu que alguns especulavam sobre possíveis punições em curso e que
outros se mostravam aterrorizados com o assassinato de um dos aventureiros sem
motivos aparentes... E foi aí que Loredano resolveu insuflar a ira nos homens...
Perguntou-lhes se não sabiam o que aquilo significava... Obviamente os demais
pediram-lhe que explicasse. E ele instigou-os ao ódio... Mostrou a própria mão ferida
pela flecha e fez crer que havia uma operação macabra em progresso contra
eles... Um deles estava ali morto à frente de todos, ele mesmo havia
sobrevivido a um atentado, e quem é que sabia do paradeiro de Rui Soeiro? Os
que o ouviam especularam a respeito dessa indagação...
Os homens queriam que Loredano revelasse a autoria de
tais perseguições... Para provocá-los, ele perguntou quem é que, na casa,
poderia desejar a morte dos brancos e a destruição da religião... Ele mesmo
respondeu que só podia ser “o herege, o gentio, o selvagem traidor e infame”.
Os demais concluíram acertadamente que ele se referia a Peri. Então ele
completou dizendo que o desejo do índio era o de assassinar a todos para
vingar-se... Vasco Afonso e Martim Vaz se manifestaram... Indignados com a morte
covarde de Simões, exigiam justiça...
Já aos brados, os aventureiros quiseram sair em perseguição a Peri para matá-lo.
Mas foram interrompidos por Loredano, que os alertou sobre a proteção que o
índio tinha na casa... Para eles aquela proteção de nada valia, pois “o
protegido tratava-se de um criminoso”... Então o líder italiano explicou-lhes
que estavam enganados porque aquele que protegia o índio o julgaria inocente. E
acrescentou que muitos outros ainda o defenderiam... Para provocá-los ainda
mais, disse que no final teriam que se calar e baixar a cabeça.
Com a ajuda da interpretação que Loredano imprimia aos
fatos, os aventureiros foram entendendo que eram verdadeiros escravos na
propriedade de d. Mariz... O bandido disse ainda que não teriam alternativa ao
não ser aceitar passivamente a morte dos companheiros.
Um dos aventureiros demonstrou indignação e desejo de ir até o fidalgo
para exigir que ele entregasse Peri... Outro revelou que se o patrão não
atendesse a exigência, se desligariam do juramento que prestaram para fazer
justiça com as próprias mãos... Foi João Feio quem se dispôs a parlamentar com
d. Antônio garantindo que sabia bem o que diria a ele.
Mas aconteceu que antes que João Feio se
retirasse, d. Mariz apareceu no alpendre garantindo que estava ali para
poupar-lhes tempo... O fidalgo estava calmo, desarmado, impassível.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/09/o-guarani-de-jose-de-alencar-aires.html
Leia: O guarani. Editora Ática.
Um abraço,
Prof.Gilberto