quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Considerações a partir do texto de Isabel Lustosa para “O Estado de São Paulo” (“O imperador e suas duas mulheres”, caderno “Aliás” do último dia 24 de fevereiro) – Segunda Parte; bijuterias no túmulo de Leopoldina; Pedro I, suas fraturas; dona Amélia mumificada

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/02/consideracoes-partir-do-texto-de-isabel.html antes de ler esta postagem:

A exumação de dona Leopoldina confirmou o estado de pobreza que ela, ainda que fosse a imperatriz do Brasil, suportou em seus últimos dias ao lado de Pedro I. Joias falsas a ornamentam no caixão... Isso é consequência da penúria econômica do país ao tempo do Primeiro Reinado. Sabemos que com o fim do Período Joanino (d. João VI retornou a Portugal em 1821), as finanças do Brasil beiraram o colapso, já que com a família real que partiu para a Europa seguiu o carregamento de todo o ouro do Banco do Brasil. Essa situação serviu de justificativa para que Pedro I controlasse todas as despesas da esposa, que abriu mão do direito (estabelecido por contrato) de gerir dinheiro... O texto de Laurentino Gomes dedicado à Leopoldina (em 1822) relata seus esforços em obter empréstimos com agiotas para garantir a assistência que prestava aos mais necessitados.
(...)
Os restos mortais de Pedro I confirmam a constituição física de um tipo ativo, que se dedicava a longas cavalgadas... Aliás, as costelas quebradas (confirmadas nos exames) são resultado de conhecidas passagens de sua biografia: queda de cavalo em 1823 e acidente, também envolvendo cavalos, em 1829.
Lustosa afirma que, para os conhecedores da biografia de Pedro I, não se deve estranhar o fato de não haver junto ao seu corpo insígnias brasileiras, apenas portuguesas...
Ele era conhecido pelo desprezo às insígnias... Conta-se que poucos meses após a abdicação, desfilou ao lado do rei Luis Felipe, em Paris, por ocasião do primeiro aniversário da Revolução de 1830 (portanto em julho de 1831). Teve repercussão o fato de o ex-imperador do Brasil não ostentar nenhuma condecoração em seu peito, além da “Ordem da Rosa” que ele mesmo havia criado no Brasil para homenagear dona Amélia... Talvez por ter visto naquilo um sinal de carência, o rei francês fez Casimir Périer condecorar d. Pedro com a “Legião de Honra”...
D. Pedro permaneceu em Paris até o início de 1832. Seus últimos anos foram de engajamento no conflito contra o próprio irmão, d. Miguel, para restituir o trono à filha Maria da Glória. Lustosa cita a frase que, de joelhos, proferiu para a jovem: “Minha senhora, aqui está um general português que vai defender seus direitos e restituir-lhe a coroa”.
D. Pedro faleceu em 1834 depois de ter cumprido a promessa que fizera à filha... Não são poucas as contradições... Para muitos não é fácil assimilar que aquele que enaltecem como “herói” da independência do Brasil, comandante que não media esforços para estar entre os soldados em campo de batalha, e “defensor da Constituição e do Liberalismo”, seja conhecido também por suas atitudes autoritárias, lascivas e de agressor da própria mulher.
(...)
A exumação de dona Amélia revelou um corpo mumificado... Algo impressionante, mas que (devido à sua curta vivência entre os brasileiros) desperta pouco interesse... Ela contava apenas 17 anos quando veio para o Brasil... Ainda muito jovem, sua beleza encantou o imperador. Seus atributos chamaram a atenção dos franceses, e o fato de ser neta de Napoleão (era filha de Eugênio Beaucharnais – um enteado admitido como filho por Bonaparte) aumentava ainda mais o seu prestígio.
Após a morte de d. Pedro em 1834, dona Amélia permaneceu em Portugal... Aos poucos a sua presença foi se “apagando”, principalmente porque ao que parece não efetivou vínculos com os círculos de poder em torno da enteada, dona Maria II. A filha que tivera com Pedro I no Brasil, Amélia Eugênia, morreu aos 21 anos de tuberculose na ilha da Madeira. Essa perda causou-lhe profunda angústia, atestada em carta que escreveu (preservada em arquivo pessoal do arquiteto Luciano Cavalcanti de Albuquerque, descendente da condessa de Belmonte).
Ao final de seu texto, Lustosa afirma que a “exumação dos corpos imperiais” não revelou nenhum fato novo... Apesar disso, devemos considerar a importância dos recursos científicos modernos, cada vez mais inseridos nas pesquisas que os historiadores realizam... Enquanto documentos, os corpos são tão valiosos como os papéis que estão em pastas de arquivos... Eles também contribuem para “jogar luz sobre uma época, os costumes dessa época e as pessoas que nela viveram, soberanos ou escravos”.
Um abraço,
Prof.Gilberto

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Considerações a partir do texto de Isabel Lustosa para "O Estado de São Paulo", "O imperador e suas duas mulheres", caderno "Aliás" do último dia 24 de fevereiro) – Primeira Parte; dona Leopoldina

Ocorreu a exumação dos cadáveres de d. Pedro I, dona Leopoldina e de dona Amélia. Algo que os especialistas tiveram de responder foi a respeito da importância do projeto e seus resultados... O texto da historiadora Isabel Lustosa para O Estado de São Paulo (O imperador e suas duas mulheres, caderno Aliás do último dia 24 de fevereiro) destaca que o saldo final é a confirmação do que pesquisas importantes já haviam revelado... Alguns poderiam dizer que, assim sendo, de pouco proveito resultou a investigação.
Há que se levar em conta, no mínimo, que a biografia de Pedro I elaborada por Otávio Tarquínio de Sousa (José Olympio, 1952) é produção completa... Seus três volumes são referência quando o assunto é Primeiro Reinado (1822-1831) e a vida do imperador... Lustosa leva em consideração o fato de biografias posteriores terem o mérito de apresentar “novos olhares” em relação aos personagens e sobre os posicionamentos que tomaram nos contextos em que foram atores... O trabalho de pesquisa de Carlos Oberacker, que resultou em biografia de dona Leopoldina (Conselho Federal de Cultura, 1973), constitui-se no que podemos chamar de “maior volume já elaborado a respeito da primeira esposa de Pedro I”... Sobre dona Amélia não há muito material disponível, sobretudo porque, a respeito de sua vida, pouco se escreveu... É claro que o fato de ter permanecido no Brasil por breve período (1829-1831) explica os poucos testemunhos ao seu respeito. Há uma importante biografia dela, escrita por Maria Junqueira Schmidt, publicada em 1927.
Sobre dona Leopoldina:
Causou expectativa a exumação de dona Leopoldina, já que muitos esperavam encontrar o “fêmur fraturado”, produto de agressão do imperador Pedro I... Mas isso não se confirmou e, de acordo com Lustosa, para os que conhecem a pesquisa de Oberacker, a maior surpresa foi mesmo a “hipótese de fratura” que sugeriram antes da investigação. É que o historiador debruçou-se sobre ampla documentação, inclusive os boletins médicos... Lustosa acrescenta que os registros do médico que atendeu dona Leopoldina, o barão de Inhomirim, apontou “inchação erisipelatosa de toda a coxa, perna e pé”, mas nada de fratura...
Para muitos a agressão de Pedro I teria provocado o aborto de a esposa sofreu, pois esta teria recebido um chute no ventre... Mas a relação entre os dois episódios (agressão de 20/11/1826; aborto em 1-2/12/1826) aparece descartada no texto porque ocorreram em ocasiões bem separadas pelo tempo...
O fim do Primeiro Reinado foi marcado por muitas crises e críticas ao monarca. Muitos comentavam sobre o seu comportamento em relação à esposa real, que era prestigiada por grande parte da população... Falava-se que ele a maltratava com agressões de violência extremada... Após a abdicação (7 de abril de 1831) os rumores cresceram ainda mais.
Muitos boatos davam conta da infidelidade e agressividade de Pedro I em relação à dona Leopoldina... Por esses e outros motivos (destacados em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2011/04/consideracoes-sobre-princesa-leopoldina.html) a esposa real entrou em terrível depressão... O monarca sabia que essa situação era de peso político muito negativo para a sua imagem. E é por isso que ele insistiu em exibir a esposa em ambientes onde também estivesse presente Domitila de Castro, sua amante. Dos golpes que Leopoldina sofreu do imperador, o mais comentado teria ocorrido em 20 de novembro de 1826 (vésperas da partida de Pedro I para a Cisplatina, onde tropas brasileiras combatiam a iniciativa emancipacionista; essa guerra resultou na independência do Uruguai em 1828).
Então, nessa ocasião do dia 20 de novembro, cerimônia em que os súditos compareciam para o “beija-mão” (do imperador), Pedro I queria que todos vissem as duas em sua companhia para mostrar que não havia “desentendimentos reais”... Mas testemunhas contam que o casal discutiu em alto volume, despertando a atenção dos que aguardavam na antecâmara... Conta-se que Leopoldina, que não queria permanecer na mesma sala com Domitila de Castro, teria sido jogada (ou se atirado) ao chão e sofrido o pontapé no ventre.
O comerciante inglês, John Armitage (que viveu na capital nos anos 1820-1830) registrou em seu História do Brasil que uma “entrevista” do monarca com a imperatriz resultou em desentendimento e até “pancadas reais”. E também o soldado Carl Seidl (alemão que lutou na Guerra da Cisplatina) afirmava que, depois da morte dela, muito se falou do nervosismo de Pedro I que, “em momento de cólera maltratara gravemente sua esposa em adiantada gravidez”, que “lhe dera pontapés”, e que essas agressões extremadas teriam sido a causa da morte de Leopoldina (11 de dezembro de 1826).
É fato que a fama de agressivo do imperador chegou à Europa... O diplomata francês, Gabriac, noticiou em sua correspondência as contusões que Leopoldina apresentava após a partida de Pedro I para a guerra no sul... Sem dúvida isso foi motivo para que pelo menos 16 princesas se recusassem a aceitá-lo como esposo logo que se tornou viúvo.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/02/consideracoes-partir-do-texto-de-isabel_27.html
Um abraço,
Prof.Gilberto

domingo, 24 de fevereiro de 2013

“Ei! Tem alguém aí?”, de Jostein Gaarder – outras semelhanças; descobertas maravilhosas; a visão, a comunicação, o pensamento; uma diferença, “leitura de pensamentos”

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/02/ei-tem-alguem-ai-de-jostein-gaarder-os.html antes de ler esta postagem:

Joakim e Mika prosseguiram conversando sobre as descobertas que faziam. Trataram da importância dos sentidos e apreciavam as semelhanças entre os dois... Foi o garoto do espaço quem atentou para umas pequenas flores que cresciam entre as rochas do elevado lugar (o montinho) onde estavam... Joakim observou que o outro aproximava as flores dos olhos... Disse que é para isso mesmo que temos os olhos... Falaram sobre a maravilhosa possibilidade de enxergarmos... Já era o entardecer e Mika podia fitar o sol avermelhado (bem diferente do que ocorreu pela manhã), então disse que graças à visão podiam encontrar comida com mais facilidade e se protegerem de perigos... Mas isso é “o básico” porque, enxergando, podemos olhar tudo o que existe... O espaço sobre nós pode ser contemplado e nos levar a reflexões diversas... Podemos olhar as expressões e os olhos das outras pessoas e perguntar sobre o que elas pensam... Joakim ouviu a tudo isso e considerou sobre a grata possibilidade de se posicionarem ali e poder ver o mar, os recifes e outras paisagens marítimas.
Mika voltou a falar sobre o ovo, “um milagre”. Disse mais dessa vez... Falou que era maravilhoso saber que dentro dele havia toda a potencialidade do “vir a ser”... É apenas um ovo, mas em seu interior um ser com dois olhos se formará, e com aqueles olhos descobrirá o mundo... O ser já é, em si, parte daquele mesmo mundo... Sem dúvida, algo maravilhoso de se pensar. Joakim refletia sobre a verdade daquelas palavras e sobre a realidade humana, quer dizer, entre os terráqueos é dentro da barriga de uma mãe que aquela maravilha se processa.
Mas Joakim nada falou sobre o que pensava, e ouviu o amigo dizer que, de fato, eram muito parecidos. E, como que sintetizando o que vinham falando há algum tempo, observou que ambos podiam ouvir, distinguir sabores e cheiros, senti-las a partir do tato e enxergar... E que ser dotado desses sentidos deve fazer muita diferença, pois eles nos dão vantagens, e isso deve ser valioso em qualquer parte do universo... Notaram que outros animais possuem características semelhantes, porém eles não se parecem nada com os humanos ou os evoluídos mumbos de Eljo.
Pensaram sobre isso e falaram sobre a mudança que há milhões de anos aconteceu, quando os antepassados de ambos deixaram de usar quatro pernas para se locomoverem... Permanecendo de pé, seus membros dianteiros se desenvolveram e se tornaram braços com mãos dotadas muitas habilidades a se desenvolverem no decurso da existência da espécie... Joakim perguntou o porquê dessa configuração (dois braços e duas pernas) e não outra... O menino viu a deferência do amigo, que disse que tanto os semelhantes a Joakim quanto os de Eljo descendiam de animais de quatro pernas... Joakim relacionou as palavras do garoto do espaço à constatação de que os anfíbios só têm quatro patas, “o suficiente para duas pernas e dois braços”... Mas achava estranha a coincidência de os dois descenderem de criaturas de quatro patas... 
Como que adivinhando as reflexões de Joakim, Mika disparou que se tivessem mais pernas ou braços não fariam muito mais coisas do que as que já eram capazes de realizar... A ”configuração” dos humanos e a dos mumbos de Eljo é o suficiente para garantir a continuidade da espécie...
Neste ponto do texto que Joakim escreve para a pequena Camila, ele se mostra mais uma vez encantado com as descobertas daquele encontro com o garoto espacial... Destacou que os anfíbios já possuíam todos os atributos que viriam a se concretizar no que é o ser humano... Ao rastejarem para fora dos mares com suas quatro patas levavam em si os genes que permitiram a evolução... Um “pequeno rastejar” que resultou no que viria a ser a humanidade.
Mika lembrou que tanto nos mumbos quanto nos humanos houve a evolução do cérebro na medida em que as mãos fabricaram utensílios, armas e outros objetos importantes para a manutenção da vida... Essas habilidades permitiram que humanos e a principal espécie de Eljo levassem muita vantagem sobre as espécies que permaneceram com braços e mãos ociosos.
Os dois concordavam cada vez mais que eram mesmo muito parecidos... E foi Mika quem se arriscou a eleger a principal semelhança entre eles: a capacidade de pensar, que foi desenvolvida no decorrer de bilhões de anos... Joakim concordou e relacionou essa capacidade ao tamanho das cabeças de ambos... O amigo do espaço mostrou preocupação ao dizer que por causa dessa característica (e do modo como os humanos nascem) a mãe de Joakim poderia sofrer durante o nascimento do irmãozinho... Joakim emendou que no hospital há pessoas preparadas para ajudar no parto... Abanando animadamente os dedos, Mika concordou que a comunicação é outra característica muito importante e comum entre os dois.
O menino do espaço logo pensou na condição favorável de viajar pelo espaço contando com o recurso da comunicação... Joakim associou isso à conhecida frase do astronauta Armstrong ao iniciar os passos na Lua (e pensou: Um pequeno passo para o homem...). E não é que Mika disse que se tratava de um grande passo para o homem? Isso obviamente surpreendeu o menino terráqueo, que perguntou o que o outro dissera... Mika não só repetiu o início da frase como a completou (Um passo gigantesco para a humanidade).
Joakim quis saber como que Mika sabia daquilo... Não só era coincidência demais, como ainda não tinha falado nada sobre a viagem da Apolo 11... Mika pediu desculpa e falou que não pôde se controlar... Em Eljo, os de sua espécie têm a capacidade de ler os pensamentos uns dos outros sem diálogos... E Mika considerou muito interessantes as reflexões do amigo. Ele explicou ainda que era graças a essa capacidade que conseguia aprender sobre o planeta Terra com a conversa do dia e falar a mesma língua de Joakim. Ele revelou que estivera “lendo” os pensamentos do amigo.
Joakim deu de ombros... Falou que enfim descobriram algo em que não eram semelhantes, pois, até onde sabia, os humanos não têm a capacidade de “ler pensamentos” uns dos outros.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/03/ei-tem-alguem-ai-de-jostein-gaarder-uma.html
Leia: Ei! Tem alguém aí? Companhia das Letrinhas.
Um abraço,
Prof.Gilberto

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

A incrível história de Giovanni de Agostini, que peregrinou pelo continente americano e teve seguidores até o fim de seus dias – Segunda Parte

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/02/a-incrivel-historia-de-giovanni-de.html antes de ler esta postagem:

João Maria de Agostini foi admirado também por figuras ilustres. Todos notaram a sua diferenciada formação cultural, conhecimento teológico e do Evangelho... Comunicava-se em português e dominava latim e o francês. O monge de beatos aspectos foi muito elogiado por Joaquim Gomes de Oliveira e Paiva, padre e deputado em Santa Catarina. Após encontro com o monge na ilha do Arvoredo em fevereiro de 1849, Paiva declarou que o monge era “digno de admiração e respeito por sua conduta religiosa e vida solitária como a dos primeiros cristãos da História.
Em 1852 o monge seguiu para o Paraguai e de lá para outras paragens. Mas o período em que esteve em terras brasileiras foi tão significativo que, durante muito tempo, falou-se sobre João Maria e seus feitos... Houve quem se inspirasse nele e adotasse a peregrinação religiosa como modo de vida. Registram-se pelo menos três “monges peregrinos” que, ao longo da segunda metade do século XIX, percorreram o sul do Brasil e também ficaram conhecidos como João Maria... Não faltaram aqueles que aguardaram com ansiedade o retorno do homem das “águas santas”.
Agostini permaneceu por algum tempo em Monte Palma (que por aquele tempo pertencia ao território paraguaio, na região das missões jesuíticas, e que, após a Guerra do Paraguai, tornou-se parte da província argentina de Misiones, localidade que mais tarde ficou conhecida como “Cerro Del Monje”)... Passou-se mais ou menos um ano e ele foi visto em Buenos Aires... Algum tempo depois atravessou os Andes e até 1856 permaneceu no Chile. De 1857 a 1861 percorreu e se instalou por determinados períodos na Bolívia, Peru, México, Cuba e Canadá... A presença do monge nessas localidades despertou a fé de grande número de fiéis. As autoridades, em tempos de consolidação da autonomia nacional, viam com muita desconfiança o perambular do religioso estrangeiro, desconfiavam de suas intenções e não viam com “bons olhos” o fato de ele atrair grandes contingentes...
Em 1861, depois de passar pelo Canadá, percorreu quase 1000 quilômetros a pé em direção às terras do Novo México... Vivia isolado em montanhas e continuava a atrair muitos seguidores... Em 1867 decidiu se instalar numa gruta próxima à Vila de Las Cruces. Os moradores da localidade o alertaram sobre os perigos que sua vida corria ali devido ao grande número de índios hostis das cercanias. João Maria já contava mais de sessenta anos, mas permanecia resoluto em sua opção asceta e disse, conforme citado à página 25 (da edição 85 - outubro de 2012 - da Revista de História da Biblioteca Nacional), que acenderia uma fogueira todas as sextas-feiras... Assim, ao longe, saberiam que ele continuava vivo e a orar por todos... Durante dois anos foi isso o que ocorreu... Eventualmente descia à vila para catequizar, tratar dos doentes e evangelizar.
Numa sexta-feira de abril de 1869 o povoado notou que nenhuma fogueira se acendeu. E foi assim que todos souberam que o monge João Maria havia sido misteriosamente assassinado.
O crime jamais foi desvendado... Entre passaportes, cartas de recomendações e folhas contendo suas memórias, encontraram uma fotografia de 1867 tirada em Santa Fé (reproduzida na postagem anterior), nela o beato aparece com o manto, o hábito religioso e a Bíblia... As características do retratado confirmam as descrições do “Frei João Maria d’Agostinho” contidas no Livro de Registros de Estrangeiros da cidade de Sorocaba (com data de 24 de dezembro de 1844) que faziam referência ao fato de o registrado não possuir três dedos da mão esquerda.
O monge foi sepultado no cemitério de Mesilla, sul do Novo México... Uma nota ao final do texto revela que o sobrenome Justiniani está gravado na pedra, indicando que seus últimos interlocutores deram crédito à história contata por Agostini acerca de sua descendência do imperador romano Justiniano... Karsburg encerra afirmando que o local, longe da veneração e tumulto, é como que “um prêmio tardio para quem sempre perseguiu a perfeita solidão”.
A ilustração dessa página é creditada a João Teófilo e foi extraída de http://www.revistadehistoria.com.br/secao/capa/assim-caminhou-joao-maria (22/02/2013; 18:00)
Um abraço,
Prof.Gilberto

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

A incrível história de Giovanni de Agostini, que no Brasil tornou-se João Maria – Primeira Parte

A edição 85 (outubro de 2012) da Revista de História da Biblioteca Nacional publicou uma série de textos com referências aos 100 anos da Guerra do Contestado... O dossiê Contestado, 100 anos tem subtítulo Massacre e Progresso. Entre os estudos que compõem o material, está Assim caminhou João Maria, de Alexandre Karsburg, autor da tese O eremita do Novo Mundo: a trajetória de um peregrino italiano na América do século XIX (1838-1869); UFRJ 2012.

A história de Giovanni de Agostini, um italiano que se tornou peregrino religioso no continente americano, é fantástica... Ele nasceu em 1801 na localidade de Sizzano (no Piemonte). Após a morte da mãe, em 1819, andou por Roma, França e Espanha. Decidiu-se pela vocação religiosa e tornou-se monge... Não se adequando à vida intramuros dos mosteiros, decidiu partir para o Novo Mundo, onde, tal como as descrições dos antigos beatos e profetas, iniciou a peregrinação asceta.
Desembarcou em junho de 1838 na capital venezuelana... Cinco anos depois transferiu-se para o Brasil, onde esteve até 1852. Cidades como Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba, Porto Alegre e Desterro (antigo nome de Florianópolis) foram por ele visitadas. Sua intenção era receber autorização para evangelizar em meio ao povo, então recorria às autoridades religiosas (bispos) e políticas (presidentes das províncias)... Depois de autorizado, rumava para o interior como missionário. Em pouco tempo tornou-se conhecido como um monge solitário... Trajava-se como os capuchinhos... Sua austeridade era notada também pelos longos cabelos e barba... Os que o viam com o hábito religioso julgavam tratar-se de um “profeta bíblico”... Mas era um leigo, não pertencia a nenhuma Ordem Religiosa, porém a missão a que se devotou era levada muito a sério. Com suas sandálias surradas, seguia em direção ao sul, levando a Bíblia, medalhas de Nossa Senhora e um cajado... Confeccionava rosários e crucifixos em madeira para trocar por alimento ou dinheiro que permitisse continuar o seu percurso... Os que o ouviam conheciam os seus ensinamentos acerca do fim dos tempos e da necessidade de voltar-se a uma vida de devoção, sem ostentar riqueza... Agostini falava da penitência como forma de se livrar da punição do inferno.
Não foram poucos os locais onde, junto com os capuchinhos, criou cruzeiros e vias-sacras para que os rituais de oração e de referência à Paixão de Cristo fossem mantidos e praticados pelos fiéis... Em terras gaúchas sua fama cresceu enormemente e tornou-se seguido de perto por uma legião de pessoas que acreditavam que ele tinha poder de curas milagrosas... O beato manipulava e reconhecia propriedades medicinais de ervas e raízes, com as quais fazia chás e unguentos que receitava a enfermos de doenças diversas. Doentes, fanáticos religiosos e curiosos apareciam das mais diferentes partes do Brasil, e também de países vizinhos.
Não demorou e os seus feitos foram parar nos jornais, que o chamavam de monge estrangeiro, conhecedor de “águas santas” que curam até mesmo paralisias e fraturas... As reportagens despertaram o interesse de médicos, que acabaram visitando as localidades percorridas por Agostini (que passou a ser conhecido como monge João Maria de Agostini) e constataram que as águas eram apenas potáveis, sem nenhuma propriedade espetacular. Sintetizaram os episódios como exploração da “fé ingênua” da gente do povo.
Aqueles eram tempos em que muitos missionários autorizados pelo império percorriam o Brasil... Eles faziam o seu trabalho evangelizador ao mesmo tempo em que apaziguavam confrontos políticos, além de “civilizar” índios hostis à ordem estabelecida. Então, o próprio Pedro II decidiu junto aos seus auxiliares mais diretos que deveria conhecer de perto o fenômeno das “águas santas”... São as memórias do próprio João Maria que revelam a audiência com o imperador... Segundo os registros, Pedro II simpatizou-se com o monge e ofereceu-lhe privilégios, porém o asceta os rejeitou, destacando que procurava uma vida de “solidão e sofrimento”...
Depois do contato com o monarca, João Maria nunca mais retornou ao Rio de Janeiro... Sabe-se que sofreu acusações de charlatanismo, uso ilegal da medicina, promessas de curas e impostura religiosa. O governo do Rio Grande do Sul e a Academia imperial de Medicina (Rio de Janeiro) pretendiam levar a cabo processos contra ele, mas talvez graças ao contato prestigioso com o imperador, Eusébio de Queirós (ministro da Justiça por aquela época) o inocentou.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/02/a-incrivel-historia-de-giovanni-de_22.html
Um abraço,
Prof.Gilberto

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

“Os vadios do século XVIII”, de Laura Vergueiro, em “Novos Estudos CEBRAP” de abril de 1982 – considerações sobre “Instrução para o Governo da Capitania de Minas Gerais” (1780), obra de José João Teixeira Coelho; a utilidade do vadio

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/02/os-vadios-do-seculo-xviii-de-laura.html antes de ler esta postagem:

O texto que segue tem como referência a leitura do periódico Novos Estudos Cebrap, vol. 1 Nº 2 Abril de 1982. Naquela edição, os estudos coordenados por Roberto Schwarz tinham como “tema gerador” Os pobres na Literatura Brasileira. A referência aqui é o texto de Laura Vergueiro, Os vadios do século XVIII.

Percebemos que, em Antonil, os pobres eram mal vistos... Eram considerados verdadeiros incômodos, ônus para a administração... Essa parte da sociedade, por sua “negação ao trabalho”, era considerada improdutiva... Vadios que prejudicavam a “parte sã da população”.
Já em fins do século XVIII, o desembargador Teixeira Coelho tratou da condição dos desfavorecidos com atenção diferenciada. Em trecho do autor, selecionado por Vergueiro, lemos Os vadios são o ódio de todas as nações civilizadas, e contra eles se tem muitas vezes legislado... Após essa primeira consideração, o magistrado apresenta argumentos que justificam a importância e utilidade dessa gente na região das minas de ouro, pois eram eles que desbravavam os sertões, perseguiam índios e muito contribuíram para a destruição de quilombos. Não é por acaso que Vergueiro deu ao tópico em questão o título de A utilidade do vadio.
É o próprio Teixeira quem esclarece que “as regras comuns a este ponto (vadios enquanto motivo de ódio e alvo das leis) não podem ser aplicáveis ao território das minas; porque estes vadios, que em outras partes seriam prejudiciais, são ali úteis”... E quem eram os que povoavam os “sítios remotos do Cuieté, Abre Campo, Peçanha e outros?” A leitura do documento revela-nos que “à exceção de um pequeno número de brancos, são todos mulatos, caboclos, mestiços e negros forros”... Suas tarefas em terras bravias não eram nem um pouco desprezíveis... Ainda de acordo com o magistrado, “deles é que se compõem as esquadras que defendem o presídio do mesmo Cuieté da irrupção do gentio bárbaro, e que penetram, como feras, os matos virgens, no seguimento do mesmo gentio: e deles é, finalmente, que se compõem também as esquadras, que muitas vezes se espalham pelos matos, para destruir os quilombos dos negros fugidos, e que ajudam as justiças nas prisões dos réus”.
Vergueiro destaca que o trecho selecionado é “impar na literatura”, dado que defende a “utilização de um contingente humano normalmente considerado inútil”. E isso chama atenção porque a “inutilidade do vadio” era percepção não apenas no Brasil, mas em todo o Ocidente... A legislação repressiva contra os vadios atravessava os primórdios da colonização no século XVI e entrava pelo século XVIII... Os juízos de Antonil acerca desta parte da sociedade podem ser considerados ecos das preocupações de autoridades políticas e religiosas europeias, que definiam “vagabundo como peso inútil da terra”... Os vadios eram fechados em workhouses, hospícios e instituições de caridade.
As passagens do sistema feudal para o modelo pré-capitalista provocaram a expropriação de numerosas famílias, que foram absorvidas por manufaturas e obras públicas... Teixeira Coelho vislumbrava a mesma expectativa para os “vadios da colônia”. E isso resolvia uma importante lacuna, já que nem os escravos nem os “valorosos e laboriosos colonizadores brancos” podiam “povoar pontos distantes acossados por índios; engrossar as expedições para destruir quilombos; exterminar foragidos”...
Os pobres, a partir dessa concepção de Teixeira, viriam a se tornar “pau para toda obra”... Outro trecho selecionado por Vergueiro confirma as afirmações anteriores: “... porque como a conservação dessa conquista (do Cuieté) era necessária, e se não podia conseguir, sem que nela houvesse um corpo de tropas da dita qualidade, para se opor aos assaltos dos índios, que lhe pareceu que era mais conforme a razão, o ser a mesma tropa composta de homens vadios, e facinorosos, do que de homens bem morigerados, e preciosos para a cultura das terras”.
Finalizando o texto, Vergueiro destaca que o intendente da Fazenda da capitania de Minas, sem abandonar os preconceitos em relação aos homens livres pobres, levou em consideração o seu “lado aproveitável”... Teixeira Coelho representou, de acordo com as palavras de Vergueiro, “os primeiros alvores de uma mentalidade capitalista”.
Um abraço,
Prof.Gilberto

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

“Os vadios do século XVIII”, de Laura Vergueiro, em “Novos Estudos CEBRAP” de abril de 1982 – considerações sobre "Cultura e Opulência do Brasil por suas drogas e minas", obra de Antonil

O texto que segue tem como referência a leitura do periódico Novos Estudos Cebrap, vol. 1 Nº 2 Abril de 1982. Naquela edição, os estudos coordenados por Roberto Schwarz tinham como “tema gerador” Os pobres na Literatura Brasileira. A referência aqui é o texto de Laura Vergueiro, Os vadios do século XVIII.

Memórias, Crônicas e Instruções redigidas durante o século XVIII registraram juízos e determinaram regras que faziam referências à condição de vida dos pobres que habitavam o Brasil colonial, todavia essa literatura foi pouco utilizada pela historiografia.
Em seu texto, Vergueiro não tratou das implicações ideológicas decorrentes da omissão dos pesquisadores e das “grandes explicações do Brasil” em relação aos menos favorecidos... Seu texto traz reflexões sobre os escritos de Antonil e Teixeira Coelho, nos quais os “pobres da colônia” estão focalizados.
José João Teixeira Coelho, alto funcionário e magistrado na região das minas de ouro, escreveu Instrução para o Governo da Capitania de Minas Gerais (1780). Sobre o seu conteúdo trataremos nas próximas postagens.
Cultura e Opulência do Brasil por suas drogas e minas, obra de Antonil publicada em 1711, foi confiscada pelas autoridades da metrópole e quase totalmente destruída. Essa perseguição devia-se ao conteúdo repleto de detalhes sobre as riquezas coloniais, algo que Portugal não tinha o menor interesse de difundir. Vergueiro destaca este fato e ressalta a importância de alguns exemplares terem sido preservados (a obra foi reeditada em 1837, no Rio de Janeiro).
Por “pobres da colônia” devemos entender pessoas livres, porém desvinculadas dos mecanismos produtivos... Homens desfavorecidos que, por sua condição e modos de proceder no cotidiano, eram comumente tratados por vadios.

Em trecho de Antonil, citado por Vergueiro, lê-se que:
Para vadios, tenha enxada e foices, e se quiserem deter no engenho, mande-lhes dizer pelo feitor que trabalhando, lhes pagarão seu jornal. E, desta sorte, ou seguirão seu caminho, ou de vadios se farão jornaleiros.

Eram vadios por estarem completamente apartados dos mecanismos que caracterizavam a produção colonial... O trecho destaca que havia a opção de se engajarem no engenho, onde “deixariam de ser vadios”... Enxadas e foices eram a sua redenção... Trabalhando, receberiam... Caso pretendessem “seguir o seu caminho”, voltariam à vadiagem.
Antonil deixa claro, ainda, a oposição que podia se verificar na sociedade de então: a parte sã constituía-se dos que trabalhavam, produziam valores e riqueza; a “parte corrompida” (nula economicamente) era formada pelos desocupados, os vadios.
O jesuíta italiano destaca que a “fama das minas de ouro” atraiu todo tipo de gente. Parte dos que para lá seguiram mereceram o destaque de Antonil... Segundo ele mesmo, eram pessoas de cabedal... Mas ele lamentava que também os vadios tivessem visto nas minas possibilidades de enriquecimento... O autor esclarece que enquanto as pessoas de bem se ocuparam nas atividades que dignificam a condição humana, os vadios lançaram mão de todo tipo de manobra indecorosa para obter ouro... A eles são dispensados adjetivos relacionados a traições e assassinatos cruéis...
Os vadios eram, então, transgressores e criminosos, pessoas que, tendo a possibilidade de escolher entre as atividades laboriosas e a “negação do trabalho”, preferiam a transgressão e a vadiagem relacionadas à última opção. Em Antonil, o sistema produtivo é descrito como perfeito, enquanto que a “má índole dos indivíduos” vadios deve ser criticada porque só podia resultar em “traições lamentáveis” e assassinatos cruéis. A síntese aí é a de um tipo completamente inútil à sociedade.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/02/os-vadios-do-seculo-xviii-de-laura_20.html
Um abraço,
Prof.Gilberto

domingo, 17 de fevereiro de 2013

“Ei! Tem alguém aí?”, de Jostein Gaarder – os amigos falam sobre suas semelhanças; sobre olfato, paladar e tato; as “vantagens” que as espécies têm em sua luta por sobrevivência

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/02/ei-tem-alguem-ai-de-jostein-gaarder_13.html antes de ler esta postagem:

Depois das importantes revelações que Mika fez sobre o seu planeta e a vida que nele se desenvolvia, sua conversa com Joakim girou em torno das semelhanças e diferenças entre os dois... Joakim refletiu sobre os mumbos de Eljo e comparou com a realidade terráquea... Fez considerações sobre o meteorito que teria atingido o nosso planeta há milhões de anos (o episódio pode ser comparado à chance que “uma pessoa tem de ganhar na loteria apostando em números sequenciais”) e que resultou na extinção dos dinossauros. Não fosse isso e o planeta teria outro tipo de configuração... Talvez a espécie dominante fosse o resultado da evolução direta dos dinossauros, como acontece em Eljo... Mas as alterações que o planeta sofreu foram desfavoráveis àqueles animais, e é por isso que os primeiros a pisarem na superfície da Lua foram mamíferos...
Mika mostrava satisfação, abanava as mãos e chupava o polegar... Concluiu que conhecer outro planeta ajuda a entender melhor o próprio planeta de origem. Então passou a relatar vantagens e desvantagens que os lugares apresentam, além disso, relacionou o tipo de habilidade que se requer perante cada situação... Locais montanhosos requerem as habilidades alpinistas; nas planícies é importante saber correr bem... Onde há muitos predadores não é interessante possuir “carne apetitosa”, nesses casos é preferível “ser venenoso”... Finalizou dizendo que possuir inteligência é o principal... Inteligência é um atributo que se deve à evolução e, graças a ela, podemos superar dificuldades.
Joakim concordou com as palavras de Mika, que questionou se a vida não está evoluindo na mesma direção nos planetas. Os dois concordavam que se pareciam muito e não conseguiam explicar os motivos de tanta semelhança. Mika ressaltou que a tarefa dos humanos da Terra e dos mumbos de Eljo era “levar a espécie adiante”... Então necessitavam de alimento e calor, precisavam se desenvolver, crescer e procriar.
O diálogo prosseguiu destacando dificuldades que as duas espécies enfrentavam, as habilidades e sentidos que desenvolveram... E assim era possível notarem as semelhanças que possuíam. Perceberam que tinham conhecer o gosto dos alimentos e que ambos possuíam língua. Em sua carta à pequena Camila, Joakim destaca o quanto é maravilhoso poder sentir o gosto, provar e saborear...
O menino Mika colocava e tirava o polegar na boca a cada reflexão que fazia sobre as semelhanças entre os dois... Destacou a importância do olfato para distinguir o cheiro das coisas... Lembrou que muitos animais têm olfato privilegiado capaz de detectar a presença de predadores ou farejar comidas a longas distâncias... Joakim conferiu que os dois tinham nariz e lembrou uma ocasião em que estava no barco com a família e foi o primeiro a sentir cheiro de gasolina que vazava do motor e, graças a isso, evitou um acidente... Destacando a maravilha que é o sentido do olfato, Joakim se lembrou também da ocasião em que estava junto aos pés de groselha e que sentiu o cheiro de bolo que exalava da longínqua cozinha... Destacou que chegou em casa antecipando que queria bolo (por que não pão ou waffle?)... Inexplicável e maravilhoso processo que se desenvolve em nossos cérebros...
Os dois refletiam sobre o fato de a possibilidade de terem órgãos de sentidos ser muito valiosa... Tanto para os terráqueos quanto para os mumbos de Eljo... Mas consideravam que podiam não sentir cheiros e gostos da mesma maneira... Podia ser que aquilo que era bom e agradável para Joakim, não fosse tão agradável (ou até venenoso) para Mika. Concluíram que a vida evoluiu de modos diferentes nos dois planetas, mas podia ser que em alguns casos o resultado da evolução fosse muito parecido... Mika notou que os da espécie de Joakim têm pele cobrindo o corpo assim como acontecia com os mumbos de Eljo... Enquanto acariciava um tufo de grama entre as pedras, destacou que a pele é importante porque permite perceber a textura do que é tocado... O tato leva-nos a recuar quando sentimos que o calor excessivo ou espinhos de certas plantas (por exemplo) representam alguma ameaça... As extremidades dos nervos enviam mensagem ao cérebro assim que esse contato se torna iminente, e então nos afastamos do perigo.
Retirando os dedos da grama, Mika mostrou a perfuração feita pelo anzol e destacou que poderia ser pior... Foi graças aos nervos nas pontas dos dedos que ele reagiu imediatamente à pontada do anzol... Concluiu que o sentido do tato deve ser uma vantagem em qualquer parte do universo. E dessa vez foi Joakim quem disse que ali estava outra semelhança entre eles. Mika completou que sentir cócegas na nuca era gostoso...
O menino de Eljo observou e mostrou as gaivotas que gritavam... Perguntou por que agiam daquela forma. Joakim falou que talvez estivessem comunicando umas às outras sobre onde encontrar alimento... Mika ressaltou a importância de poder ouvir... Poder ouvir à distância a aproximação de uma ameaça é muito importante. Poder gritar para alertar as pessoas que gostamos (como os irmãos mais novos) sobre perigos que estejam correndo é digno de louvor, mas é claro que precisamos ouvidos para escutar... Joakim destacou que, assim como ele, Mika também possuía dois ouvidos... Perguntou se apenas um não seria suficiente... O menino do espaço fez a reverência e disse que com os dois ouvidos temos uma melhor noção da posição de onde originam os sons que ouvimos e, assim, podemos escapar com mais eficiência de perigos que nos ameaçam.
Joakim observou os ouvidos de Mika e mais uma vez enfatizou a semelhança entre ambos... Silenciaram... Ouviam as gaivotas e as ondas batendo nas rochas.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/02/ei-tem-alguem-ai-de-jostein-gaarder_24.html
Leia: Ei! Tem alguém aí? Companhia das Letrinhas.
Um abraço,
Prof.Gilberto

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

“Decamerão”, de Giovanni Boccaccio – Pampineia e seu grupo; opiniões acerca da condição feminina por aquele tempo; os três protetores; início da jornada, primeira instalação e definições sobre a direção do grupo

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/02/decamerao-de-giovanni-boccaccio-o.html antes de ler esta postagem:

As colegas de Pampineia ouviram com muita atenção as palavras que ela proferiu... Apoiaram e aprovaram os seus conselhos... Até demonstraram imediato interesse em iniciar a expedição... Filomena, a mais discreta entre elas, disse que não seria sensato apressar as ações... Ela fez as demais atentarem ao fato de constituírem um grupo feminino e que, sem o auxílio masculino, não prosseguiriam sem grandes dificuldades. Argumentou que todos sabiam que o resultado daquela reunião podia ser traumático, visto que as mulheres são “briguentas, volúveis, desconfiadas, covardes e cheias de medo”... Suas palavras repercutiam as ideias que se disseminavam a respeito da condição social das mulheres. Elisa concordou e disse que sem participação masculina as mulheres não têm possibilidades de se destacar... Argumentou que os homens são “a cabeça das mulheres”, mas lembrou que seria muito difícil conseguir homens que acompanhassem a expedição porque a maior parte dos que o grupo conhecia havia morrido e, além disso, os poucos sobreviventes fugiam do caos provocado pela pestilência... Admitiu que não seria prudente recorrer a estranhos, assim deveriam encontrar o melhor modo de se prepararem para a empreitada.
Enquanto falavam sobre esses assuntos, três moços entraram na igreja. Eram eles Pânfilo, Filóstrato e Dioneio... Eram tipos agradáveis e bem educados que chegavam para buscar suas amadas, que estavam em meio ao grupo. Por isso mesmo não eram desconhecidos ali... Três delas eram os principais motivos de suas chegadas... Ao avistá-los, Pampineia sugeriu às demais que aqueles moços “discretos e cheios de valor” bem poderiam ser os guias do grupo... Neífile, por ser a amada de um dos três, disse que não sabia de nada que os desabonasse e, assim sendo, considerava-os aptos à missão. Todavia advertia sobre o fato de serem enamorados de três das mulheres do grupo e, no caso de seguirem com elas, isso poderia gerar censuras... Filomena foi uma das que não concordou com a amiga e garantiu que a honestidade impediria qualquer peso em suas consciências... Deus e a Verdade fariam a sua defesa contra qualquer infâmia que sofressem... Filomena concluiu dizendo que gostaria mesmo que eles já estivessem prontos a conduzi-las a partir daquele momento. As demais ouviram e aprovaram essas palavras.
Pampineia tinha vínculos parentescos com um dos moços... Ela chegou até eles e contou-lhes as intenções do grupo... Em nome das demais, pediu-lhes que as acompanhassem com espírito de fraternidade. A princípio imaginaram que a proposta fosse uma zombaria, mas logo notaram a seriedade da proposta e se dispuseram e partir com elas... Esclareceram sobre o que precisavam para iniciar a expedição e marcaram reencontro para a manhã do dia seguinte.
Então, na quarta-feira bem cedo, as mulheres acompanhadas de algumas criadas seguiram os três rapazes, que contavam com três serviçais... Deixaram a cidade ao raiar do sol e, após duas milhas de caminhada, reuniram-se em um sítio previamente acertado na véspera (uma montanha de modesta altitude). Ali encontraram um palácio com belo e amplo pátio. A redondeza arborizada combinava com o palácio composto por balcões, salas e quartos... Todos os seus ambientes eram bonitos e decorados com valiosas pinturas; em seu entorno havia jardins e poços com água fresca... Apreciadores de bons vinhos não teriam do que reclamar ali, pois as adegas estavam bem abastecidas. Os cômodos estavam limpos, arrumados e enfeitados com vasos de flores.
O jovem Dioneio manifestou o seu encantamento e disse que havia abandonado as suas preocupações no mesmo instante em que deixara a cidade... Disse que esperava que as mulheres também tivessem feito o mesmo... Esperava que as amigas se dispusessem a cantar com ele. Pampineia gostou do que ouviu e falou que os reunidos deviam doravante viver festivamente.
Reconhecendo a sua responsabilidade sobre o grupo, Pampineia proferiu algumas palavras sobre como ele deveria se organizar... Sugeriu que todos deveriam obedecer e respeitar um chefe, sobre o qual recairiam as responsabilidades para que os demais pudessem viver com prazer... Todos experimentariam a condição de liderar o grupo. Explicou que o primeiro a exercer a chefia seria alguém escolhido pelos demais integrantes, mas os demais “reinados” seriam definidos de outra forma.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/03/decamerao-de-giovanni-boccaccio.html
Leia: Decamerão. Editora Abril.
Um abraço,
Prof.Gilberto

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

“Ei! Tem alguém aí?”, de Jostein Gaarder – Mika esclarece a vida no planeta Eljo; os “mumbos”; impulsionado pelas Ciências Naturais, Joakim revela indagações que o acompanham desde então

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/02/ei-tem-alguem-ai-de-jostein-gaarder_11.html antes de ler esta postagem:

Já fazia umas 12 horas desde que o pai de Joakim o acordara para anunciar a expectativa do nascimento de seu irmãozinho (ou irmãzinha) e se retirou com a mãe para o hospital... Eram cinco da tarde... Ele decidiu escrever um bilhete para a tia Helena, que deveria retornar das compras em breve... O hábito dos pais de escreverem bilhetes um para o outro quando precisavam sair foi que inspirou Joakim àquela ideia... Ele nunca havia escrito um bilhete antes... Em síntese, ele comunicou que sairia para descobrir “uma coisa importante” relativa ao peixe, à farinha que ela encontrou espalhada pela casa, e ao irmãozinho que deveria chegar em breve... O bilhete foi terminado com um “volto na hora de dormir”.
Tanta curiosidade a convivência com Mika proporcionou, que ele decidiu que era momento de esclarecer suas dúvidas. A ausência de umbigo na barriga de Mika era muito intrigante... Então segurou o amigo espacial pela mão e o conduziu até uma pequena colina onde havia um arranjo de pedras feito por ele e o pai... Sentaram-se ali e por um tempo contemplaram a casa, o mar, ilhotas e recifes a certa distância... Joakim ficou satisfeito ao notar que o ruído das gaivotas poderia abafar a gritaria que porventura Mika principiasse. Se à beira-mar Joakim falou sobre a vida em seu planeta, esperava que ali no alto Mika falasse sobre as suas origens.
Abanando os dedos, e às vezes chupando o polegar, Mika principiou a falar... Parecia um tipo mais sério, e Joakim o comparou ao próprio pai... Explicou que vinha do planeta Eljo, onde a vida também se iniciara no mar sem que ninguém soubesse exatamente como... Disse ainda que, por lá, há muitas espécies diferentes... Obviamente Joakim relacionou as duas realidades, a sua e a de Mika. Mas, conforme o outro revelou mais sobre a sua procedência, as surpresas se tornaram maiores.
Mika contou que em Eljo havia animais como os dinossauros de nosso planeta... Eles também viveram há milhões de anos e são conhecidos em seu planeta como mumbos. Em Eljo nenhum animal gera filhotes vivos... Todos põem ovos de casca dura... Então Joakim quis saber como é que as criaturas como Mika nasciam...
O menino do espaço explicou que os mumbos não morreram devido a qualquer grande alteração... Nenhuma grande mudança ocorreu em Eljo que pudesse ser comparada às alterações que podem ter dizimado os dinossauros da Terra. Dizia essas coisas com euforia, mexendo os dedos efusivamente... Revelou que os mumbos se transformaram, evoluíram... Sendo assim, todos os viventes são mumbos em Eljo, inclusive ele e os de sua espécie... Nem todos sabem falar, mas os que dominam a fala podem “fazer perguntas inteligentes sobre o espaço sideral”... Essas revelações deixaram Joakim encantado... Tão encantado, que demonstrou isso na carta que escrevia à Camila.
Mika explicou que, antes de nascer, estava em um ovo que era muito bem cuidado e protegido por seus pais... Justificou isso ao afirmar que em seu planeta há animais que roubam os ovos dos outros. Então, em Eljo, o ovo é considerado o maior tesouro que alguém pode possuir... Quando Mika estava no ovo foi carregado pelos pais de um lado a outro, em um carrinho... E era como a um tesouro que eles o tratavam. Ele contou que foi se desenvolvendo dentro do ovo até chegar o momento de romper a casca. Este instante era aguardado por todos os seus parentes... Esclareceu que a criatura prestes a nascer permanece enrolada e chupando os dedos. Embora não tivesse condições de esclarecer a todas as perguntas de Joakim sobre o nascimento em seu planeta, Mika explicou que se trata de um momento muito delicado, pois a luz e os sons exteriores incomodam o bebê ao nascer...
Como num adendo, neste ponto, Joakim chama a atenção de Camila para o fato de tudo o que o amigo espacial lhe revelou ser tão emocionante e misterioso quanto a história de nosso planeta e as notícias sobre o nascimento do irmãozinho que ele contara teria sido para Mika... Após aquelas explicações, ele conseguiu entender por que o outro tinha tantos problemas em aceitar a condição dos mamíferos.
Joakim conta que aquelas revelações o tornaram (mais) apaixonado por Ciência Natural... E isso é algo que ocorre “até os dias atuais”. As palavras do amigo espacial daqueles dias de sua infância não são desconsideradas pelo cientista adulto Joakim, que não descarta a possibilidade de haver vida em outros planetas... Se assim for, pode ser que ela tenha se desenvolvido a partir de criaturas mais frágeis... Seguindo o seu raciocínio, escreve que há leis naturais que valem para todo o universo... Então pode ser que existam também regras sobre o desenvolvimento da vida a partir de organismos unicelulares até os mais complexos e pensantes.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/02/ei-tem-alguem-ai-de-jostein-gaarder-os.html
Leia: Ei! Tem alguém aí? Companhia das Letrinhas.
Um abraço,
Prof.Gilberto

Páginas