Pedir paciência para Lambert era demais... Tudo o que ele gostaria era ter a certeza de que Nadine o considerasse importante e que não o detestasse... Não era fácil sentir-se desprezado e ser visto como um intelectual sem criatividade pela própria namorada.
(...)
Mais uma vez Anne tentou elevar o seu moral, garantiu que Nadine o amava
e que só se interessava por quem tem conteúdo... Sim, Lambert podia ficar
tranquilo quanto a isso... Nadine era muito carente e necessitava de mais
manifestações amorosas de sua parte.
Enfim, Lambert demonstrou
animação. Disse que se esforçaria para convencê-la de seu amor... Tudo se
tornaria diferente porque a ideia de se sentir amado o transformaria.
(...)
Depois da “sessão” com Lambert, Anne retirou-se para
escrever ao amado Lewis... Quanta angústia! A leitura das cartas de Brogan
traziam-lhe lembranças de momentos felizes que passaram juntos... Os envelopes
e as amareladas folhas transpiravam um pouco do ambiente onde se amaram... Para
a sua infelicidade, ela sabia que não podia retribuir o mesmo calor, as mesmas
promessas e manifestação de desejo de se reencontrarem em breve... Sua
realidade incluía Robert, Nadine, os pacientes...
Para Brogan era natural escrever que a aguardava ansiosamente... Para
Anne não havia como considerar o desejo de reencontro, mas tão certo quanto
isso era o seu pertencimento a uma “outra vida”... Ela sabia que o reencontro
não seria para breve e que “nova separação” era uma certeza.
O envelope no qual Anne depositou sua carta seria
tocado pelas mãos que ela tanto conhecia e desejava... É claro que Brogan era um
tipo de carne e osso com o qual criara o vínculo afetivo, porém não eram poucas
as ocasiões em que desconfiava que o amado fosse apenas uma “criação de seu
coração”...
As nuvens escuras baixaram rapidamente... Anne deixou sua carta sobre a
mesa.
(...)
Enquanto acendia a lareira telefonava para Lambert, convidando-o para
jantar... Embora não houvesse nenhuma garantia de que o momento de refeição
reunindo Robert e o rapaz pudesse ser tranquilo, a paz reinou durante a
refeição porque, além da ausência de Nadine, nenhum dos dois entrou em “questões
polêmicas”...
(...)
Depois Dubreuilh se dirigiu ao escritório. Lambert ajudou Anne a retirar
a mesa... Nadine apareceu... Ela estava completamente molhada... Foi logo
dizendo que não pretendia jantar porque estivera com Vincent e Sezenac e que
estava muito bem alimentada... Depois disparou sem a menor cerimônia que
Vincent partilhava de sua opinião a respeito dos lamentáveis campos
soviéticos... Uma campanha de denúncias serviria apenas para dar crédito “aos
burgueses”.
Lambert respondeu que, pelo visto, o rapaz iria insistir com Henri para
que nada fosse publicado... Nadine deixou claro que sua torcida era para que
isso realmente ocorresse... Então Lambert anunciou que, em conversa com Perron,
adiantara que se nada fosse divulgado, deixaria L’Espoir.
Nadine não perdeu a chance
de provocá-lo em relação à ameaça de abandonar a equipe de L’Espoir... Lambert
se mostrava gentil depois da conversa com Anne e não queria discutir com a
moça. Disse apenas que não acreditava que ela o tivesse em tão baixa
consideração... Nadine fez questão de dizer que talvez não pensasse tão bem ao
seu respeito como ele acreditava.
Lambert disse que ela não precisava demonstrar
tanta agressividade... Nadine disparou que ele não havia sido delicado ao
permitir que ela fosse sozinha a Paris... O rapaz argumentou que ela parecia
não querer a sua companhia; a moça respondeu que ele bem poderia propor acompanhá-la.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2014/07/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir-fim.html
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto