quinta-feira, 31 de julho de 2014

“Os Mandarins”, de Simone de Beauvoir – primeiro e segundo atos; vaias e aplausos; Paule aparece no “camarim” onde Henri buscava isolamento; paralelo entre as experiências no Vercors e as cenas do segundo ato; começo da celebração

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Os três sinais da campainha soaram... Os tipos que conhecia estavam na plateia... No palco, Josette encenava o seu texto e nele percorria (com o belo vestido Amaryllis) a “aldeia calcinada e sufocada pelas vozes alemãs”...
(...)
Uma dona que estava numa das fileiras de destaque se retirou com o seu rico chapéu ao mesmo tempo em que sentenciava não suportar mais “aqueles horrores”... Gritos, vaias e aplausos eram manifestados pelo público... Henri conseguia notar a indecisão de Josette... Ao avistá-lo, a moça encheu-se de coragem e retornou ao texto com desenvoltura...
Para Henri, mais do que assistir à encenação, o público estava ali para “proferir um veredicto”... De vez em quando conseguia ouvir novos gritos de “é uma vergonha”... É claro que ele mesmo não podia interferir, não podia defender-se ou defender a querida Josette... Talvez quisessem acuá-lo com gritos de “culpado!”.
O pano desceu... Fim do primeiro ato... Vaias foram ouvidas em meio ao grande aplauso... O autor se retirou para o escritório de Vernon.
(...)
Henri buscava o isolamento para suas reflexões, mas logo a porta se abriu... Era Paule, que se achava no direito de trocar umas palavras... Mais uma vez ele notou a mudança em sua “ex”... Ela estava muito elegante. Disse que a primeira parte havia sido um “bonito escândalo” e garantiu que ele mesmo deveria estar deslumbrado...
Paule acrescentou que a mulher que tinha se retirado era uma suíça que durante a guerra havia permanecido em Genebra... Disse também que Huguette Volange teria desmaiado, e que o marido estava muito pálido... Cogitou que Louis talvez não suportasse o sucesso de Henri... Robert e Anne estavam encantados com a peça...
Henri ouviu com atenção as observações de Paule. Depois disse que seria normal se os que aplaudiram o primeiro ato despejassem vaias na sequência.
(...)
O segundo ato teve início... Veio a cena do incêndio na igreja em que homens padeceram queimados; a personagem vivida por Josette traiu o marido que ela tanto amava...
Escondido da luz, Henri contemplou o público enquanto pensava sobre as emoções que ele estava provocando... Covas surgiram na “aldeia esquelética”; discursos; som de fanfarras; viúvas em seus trajes enegrecidos... Acusariam Henri de desrespeitar os mortos?
(...)
Ele se expôs em sua peça teatral... Mas não vemos semelhanças entre o que é descrito e os episódios que Henri, Anne e Robert vivenciaram no Vercors enquanto pedalavam pelas montanhas?
A sinceridade daquele que escreve é “tão escandalosa como as crianças”... O autor “mente do mesmo modo que elas e, do mesmo modo, cada um receia, secretamente, ser um monstro”.
(...)
O pano caiu. Fim da estreia...
Incontáveis apertos de mãos... O sucesso tornou-se realidade.
Henri dirigiu-se ao restaurante. A empolgada Lucie Belhomme só tinha palavras para exaltações (“triunfo”)... A mulher não cabia em si de tanta alegria pela excelente apresentação da filha. Fazia questão de dizer que o vestido vermelho (da Amaryllis, é claro) fez a diferença... Josette protestava ao garantir que a tesoura selaria o destino do figurino... Indignada, Lulu exclamou que a “marca da casa” estava naquela preciosidade apreciada por todos...
Henri interveio dizendo que Josette era a estrela da peça... Ao notar que ele se esquivava dos flashes, Lucie o barrou e pediu para que fosse bonzinho, pois a filha precisava de publicidade.
Mais sobre essa celebração nas próximas postagens.
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto

“Os Mandarins”, de Simone de Beauvoir – Lambert se mostra empolgado por parceria com Volange em “Les Beaux Jours”; Robert e Anne aprovam a peça de Henri; a estreia

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2014/07/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir_29.html antes de ler esta postagem:

Lambert disse que havia sido convidado por Volange para trabalhar numa publicação semanária, o “Les Beaux Jours”... Henri notou que o rapaz estava se aproximando cada vez mais do grupo conservador.
(...)
Henri Perron o alertou que, trabalhando em L’Espoir, devia se sentir pouco a vontade para servir a uma “publicação de direita”... Lambert destacou que o interesse do semanário era unicamente a literatura... Henri quis saber como ele conciliaria as duas ideias, e deixou claro que os que se declaram apolíticos são os mais reacionários.
Lambert lembrou que várias vezes havia manifestado que partilhava das ideias de Louis Volange... Ambos desprezavam a política... Henri advertiu que aquele era mesmo o limite da ação de Louis, seu “inimigo político”. Essa parte final da conversa demonstrou o quanto Lambert estava mesmo mais próximo do outro... Certamente o rapaz era atraído pela neutralidade de Volange, e não se podia desconsiderar o quanto era lisonjeado por ele... Com um tipo como aquele Lambert se reconciliava “com sua consciência em relação à absolvição do pai e à fortuna herdada”...
Henri não tinha dúvida de que não podia permitir que Lambert se afastasse mais.
(...)
Era com sinceridade que Henri gostaria que “alguém de fora” assistisse a um ensaio da peça. Mas viu que Lambert se mostrava hostil, e devia mesmo ter “os seus motivos secretos” para não acompanhá-lo.
Os ensaios suscitavam dúvidas... Henri devia levá-las a sério? Salève e Josette não se entendiam; Lulu Belhomme não aceitava rasgar o belo vestido Amaryllis confeccionado especialmente para a peça; Vernon insistia que após o ensaio ofereceria uma ceia...
O autor se esforçava, mas parecia que ninguém lhe dava atenção... Foi assim que começou a admitir que “uma peça bem sucedida ou malsucedida não é coisa tão grave”... Apesar de insistir consigo mesmo que Josette deveria triunfar no fim de tudo.
Como os Dubreuilh tinham acabado de regressar de Saint-Martin, decidiu convidá-los ao ensaio... Anne aprovou, já que seria ocasião para Robert deixar o trabalho um pouco de lado.
(...)
Henri tinha receio de que Dubreuilh passasse a falar sobre o dossiê dos campos soviéticos de trabalho forçado... Mas isso não ocorreu... Podia ser mesmo que ele nem estivesse preocupado com a situação.
O ensaio teve início e foi Henri que se viu acanhado por estar junto a Anne e Robert que assistiam ao texto de sua autoria sendo dramatizado... Ao final, Robert sentenciou-lhe que o texto era “muito melhor no palco”, Garantiu que Henri podia ficar contente porque “aquilo era o que ele havia feito de melhor”... Anne concordou.
É claro que as palavras de Robert deixaram Henri animado... De sua parte, começou a pensar que talvez a peça tivesse chance de aprovação...
(...)
A noite do “ensaio geral” (que pode ser entendida como a “pré-estreia“) trouxe agitação ao coração de Henri... Ele também possuía sonhos que alimentava desde a juventude... Também ele imaginava alcançar a glória.
As pessoas chegavam e se posicionavam na plateia... Escondido, o autor recordava o seu tempo de estudante, quando escrevia peças que chegavam a ser bem recebidas... Mas eram outros tempos e outro público também...
Em breve ele saberia se suas expectativas se dariam em frustradas ou não.
(...)
Os três sinais da campainha soaram.
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto

terça-feira, 29 de julho de 2014

“Os Mandarins”, de Simone de Beauvoir – Paule está muito mudada; surpreende ao afirmar que também se tornou escritora; fim dos laços com Henri? Lambert, novos testemunhos e pressão para a publicação das denúncias contra os campos soviéticos

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2014/07/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir_28.html antes de ler esta postagem:

Enquanto Henri subia a escada pensava seriamente sobre a possibilidade de Paule ter se desapegado de seu antigo amor... Aconteceu que após a porta se abrir ele acabou se espantando ao vê-la bem transformada, sorriso no rosto, cabelos arrumados e sobrancelhas depiladas... O vestido colante que usava a tornava provocante.
(...)
Sempre a sorrir, Paule perguntou o motivo do olhar admirado de Henri... Ele não escondeu que notava que o seu modo de vestir estava muito diferente. A moça garantiu que mais surpresas ele teria e afirmou que havia começado a escrever... Disse isso enquanto levava uma piteira à boca.
Essa afirmação agitou Perron, que quis que ela contasse mais sobre aquela novidade... Paule deixou claro que “algum dia” ele saberia... Falava e mordiscava a piteira... Para Henri aquela encenação lembrava uma comédia desagradável, em nada parecida com os dramas que tantas vezes a mesma Paule fez questão de protagonizar... Ele teve vontade de arrancar-lhe a piteira e despentear os seus cabelos ajeitados...
Mas em vez disso, perguntou-lhe sobre as férias... Sem entrar em maiores detalhes, Paule disse que passou um tempo muito agradável... Depois foi a sua vez de querer saber o que o amigo andava fazendo... Ele explicou que o teatro lhe tomava muitas horas, disse que Salève era um bom diretor que se irritava por ser muito exigente... Não seria devido ao desempenho da garota? Paule estava se referindo a Josette... Henri garantiu que a outra se sairia muito bem.
Paule quis saber se Henri ainda estava envolvido emocionalmente com Josette... Ele respondeu afirmativamente e garantiu que estava mesmo apaixonado... Ela emendou que aquilo era curioso... Será que Henri acreditava mesmo que estivesse apaixonado pela filha de Lulu Belhomme? Paule sentenciou que era muito esquisito o modo como ele declarava o seu amor...
Essa conversa desagradou Henri... Então mais uma vez ele perguntou sobre como tinham sido suas férias... A tudo Paule respondia com breves palavras (esteve muito ocupada; gostou do lugar...)... De tal modo Henri se sentiu incomodado que decidiu despedir-se... Ela não impôs nenhuma condição e tampouco confirmou novo encontro.
(...)
Quando faltava uma semana para o ensaio geral da peça de Henri, Lambert retornou da Alemanha... Via-se que o rapaz tinha mudado muito depois da morte do pai... Chegou com uma série de testemunhos que havia recolhido e pôs-se a falar freneticamente a respeito deles. Depois quis saber se Henri já se dava por convencido a respeito das denúncias...
Pelo menos quanto ao “essencial”, Henri respondeu afirmativamente... Lambert perguntou se ele conhecia a opinião de Robert. Então Henri deixou claro que já fazia um bom tempo que não o via, pois Dubreuilh não saía do sítio em Saint-Martin.
Lambert exclamou que era preciso que se apressassem a respeito das denúncias e perguntou se havia decisão sobre publicá-las independentemente da posição do “velho” (referia-se a Robert Dubreuilh)... Henri respondeu que o comitê seria consultado... Depois pediu que o rapaz lhe desse oito dias de prazo, garantindo que após o ensaio geral de sua peça falaria com Dubreuilh...
Henri finalizou dizendo que iria ao teatro e perguntou se o rapaz não gostaria de acompanhá-lo. Lambert respondeu que havia lido a peça e que não gostou... Além disso, como que a justificar-se, emendou que tinha muito a fazer... É claro que Henri respeitou a crítica do amigo e não insistiu mais.
Antes de se despedirem, Lambert fez referência a um encontro que tivera com Louis Volange, ocasião em que falaram sobre um semanário que o outro esperava lançar... O cargo de redator-chefe estava sendo reservado para ele... Henri percebeu que o rapaz queria a sua opinião, então disse que conhecia até mesmo o nome do projeto, “Les Beaux Jours”, mas desconfiava que Volange não quisesse se envolver seriamente na direção... Lambert sentenciou que o fato de se ocuparem conjuntamente da publicação tornava a proposta relevante.
Henri percebeu que Lambert estava cada vez mais se aproximando do pessoal da direita...
Mas a finalização desse assunto fica para a próxima postagem.
Leia: Decamerão. Editora Abril.
Um abraço,
Prof.Gilberto

segunda-feira, 28 de julho de 2014

“Os Mandarins”, de Simone de Beauvoir – Henri retorna da Itália; verifica a correspondência e confere os documentos comprobatórios acerca dos campos de concentração soviéticos; dilema em relação à publicação; pequenos dramas nos ensaios de sua peça; encontro marcado com Paule

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2014/07/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir-fim.html antes de ler esta postagem:

As últimas postagens nos deram uma ideia a respeito do verão vivido por Anne, Robert, Nadine e Lambert em Saint-Martin... Agora, quando o foco do texto retorna à existência de Henri, se faz necessário esclarecer um pouco sobre os movimentos de outros personagens durante o mesmo período... Paule, por exemplo, retirou-se junto a Claudie de Belzunce; Josette foi para Cannes com sua mãe, Lucie Belhomme; Henri arranjou um automóvel de segunda mão e colocou-o na estrada no rumo da Itália, onde pôde descansar a mente dos problemas que sempre se relacionavam ao SRL e a L’Espoir.
(...)
Em seu retorno a Paris não pôde deixar de lidar com a papelada da correspondência acumulada... Em meio à bagunça encontrou o relatório enviado por Lambert direto da Alemanha, além disso, havia outro volume de documentos organizados por Scriassine... A noite de Perron, então, foi dedicada aos estudos desses densos materiais.
Os depoimentos de homens e mulheres que haviam se livrado dos campos de prisioneiros organizados pelos soviéticos não deixavam dúvidas... Eles constituíam algo bem diferente das suspeitas que se poderiam levantar sobre documentos extraídos do Reich, ou os “testemunhos de poloneses internados, e libertados em 1941”...
Henri pensou... Ele tinha conhecimento de documentos saídos de Moscou, como o relatório que apareceu em 1935 sobre os trabalhos nos campos de Oguepeú, ou o plano quinquenal de 1941, que destinava ao MVD (algo como “Ministério do Interior”) 14% “dos empreendimentos de construção”... Não havia como negar, os campos de trabalho forçado existiam de fato (entre outros: minas de ouro em Kolima; as de carvão de Norilek e de Vorduka; as de ferro de Stsrobelsk; as zonas de pesca de Komi...).
Todos esses locais eram institucionais... Difícil era saber quantos viviam sob o rígido controle e quais eram suas reais condições de vida e trabalho.
(...)
Para Henri não havia mais como manter-se neutro... Seria preciso denunciar. Manter silêncio equivalia a tornar-se cúmplice... Como os leitores entenderiam essa postura? Havia os comunistas, que certamente lhe fariam uma oposição ferrenha... O jornal sofreria ataques agressivos...
(...)
Pela manhã viu que operários compravam L’Espoir na banca da esquina... Ainda comprariam? Para manter silêncio em relação às denúncias teria de possuir informações consistentes... No entanto, o argumento mais forte em favor da não divulgação era o de que o regime dava o verdadeiro sentido aos campos... Diante da quantidade de provas, isso era muito pouco...Era preciso dizer aos leitores o que sabia. Essa convicção tomava conta de Henri e, se não lhe chegassem razões bem embasadas, não teria como esconder-lhes as informações.
É claro que Henri sabia de outras pressões... Mas em relação a elas podia se considerar numa trégua, dado que Robert, Lambert e Scriassine não estavam em Paris... E Samazelle também não o estava incomodando com exigências de qualquer natureza.
(...)
É por isso que ele podia se dedicar aos ensaios de sua peça... Bem diferentes eram as pressões que enfrentava nessa seara... Salève a dirigia com rigor repleto de caprichos... Josette parecia não dar conta de suportá-los, assim buscava isolamento para choramingar... Vernon tremia a cada pedido de corte das “cenas mais escandalosas”... Já Lucie Belhomme se responsabilizara pelo figurino, mas parecia não se importar com o seu “modo de ser inconveniente”... É que havia a cena em que Josette “saía de uma igreja pegando fogo”, mas para Lulu a filha não podia ser vista em trapos (apenas elegantemente vestida como se estivesse saindo de um desfile).
Também a lembrança de Paule incomodava a consciência de Henri... Ele precisava visitá-la... Desde que a moça retornara a Paris não lhe dera nenhum sinal... Telefonou-lhe e ficou admirado com o modo como ela marcou o encontro.
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto

sábado, 26 de julho de 2014

“Os Mandarins”, de Simone de Beauvoir – fim do capítulo VI; Nadine sai pilotando a motocicleta na perigosa estrada; depois da tempestade, a maior discussão do casal; rompimento?

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Então é isso...
Lambert tentou demonstrar delicadeza no retorno de Nadine. Mas nada do que dissesse fazia com que a outra reconhecesse o seu esforço. Em vez disso, nota-se que ela fazia questão de agredir.
(...)
Anne retirou-se imaginando que mais aquela discussão prosseguiria durante toda a noite. Pela manhã dirigiu-se ao jardim e notou a grande quantidade de gravetos espalhados pela grama... Ela viu que a estrada estava bem danificada e enlameada. Apesar disso, a atmosfera estava bem agradável para o trabalho com seus papéis.
Nem bem organizou a mesa, ouviu o barulho da motocicleta conduzida por Nadine na esburacada estrada... A garota imprimia alta velocidade à máquina enquanto seus cabelos esvoaçavam e sua saia “subia-lhe pelas coxas nuas”...  É claro que ela não tinha a menor condição de ouvir os protestos gritados por Lambert.
Desolado, o rapaz dirigiu a palavra à Anne... Era com preocupação que afirmava que Nadine não sabia pilotar... Ela havia pegado a chave durante a noite... Certamente estouraria a cabeça contra alguma árvore tombada na estrada.
Anne quis acalmá-lo e disse que a filha tinha o seu modo específico de “ser prudente”... Ela mesma não sentiu firmeza nas próprias palavras... O moço concluiu que não tinha feito bem ao confiar tanto em Anne quando ouviu dela que Nadine o amava... Lambert viu que o seu esforço de reconciliação na noite anterior não havia produzido resultados positivos... Mais uma vez Anne aconselhou-o a ter paciência... Ele já não sabia o que fazer para que Nadine o aceitasse...
(...)
Lambert se retirou e Anne ficou a pensar sobre o novo transtorno... Imaginou Nadine tresloucada, em alta velocidade e se desviando de buracos e troncos que haviam caído durante a tempestade... Ela devia estar refletindo sobre a sua infelicidade por não ser amada por Lambert, pela morte de Diego... Mas e Lambert? Anne sentia que também para ele aquela situação não era fácil... Em seu quarto ele devia estar se deslocando de um lado para outro e pensando em sua condição de homem ao mesmo tempo em que ainda sentia falta da “ternura maternal”, proteção e exemplo dos adultos...
Anne preocupou-se com a situação temerária na qual Nadine se metera... Mas não havia como não pensar nas provações que os dois jovens teriam de superar para se estabelecerem como adultos... As moças eram oprimidas; os rapazes sofriam as mais diversas exigências do universo masculino... Inútil esperar que Nadine e Lambert se ajudassem para superar seus traumas.
(...)
O almoço foi tenso. Via-se que Lambert estava muito nervoso... Ao mesmo tempo temia o que pudesse ocorrer a Nadine... Anne disse que provavelmente a filha nem estivesse pensando que ele se preocupava... Talvez ela estivesse dormindo tranquilamente num campo ensolarado...
O rapaz era só lamentações... Não conseguia imaginar outra coisa além de um corpo estatelado num buraco qualquer da floresta... Lambert não parava de sentenciar que Nadine era uma louca por ter saído sem a sua permissão... Até Dubreuilh, que sempre se colocava à parte desses dramas, resolveu dizer que se algo tivesse ocorrido com a filha, alguém já teria telefonado.
Mais tarde o próprio Robert Dubreuilh cogitou ligar aos postos policiais da região... Mas isso não foi necessário porque o barulho do motor anunciou a chegada de Nadine... Lambert antecipou-se a todos e foi o primeiro a recepcioná-la quando ela saía da estrada.
Motocicleta e motociclista estavam completamente enlameadas... O sorriso cínico de Nadine foi interrompido por dois tapas de Lambert... O rapaz a agarrou pelos punhos... A moça gritava pela mãe enquanto sangrava pelo nariz... Anne sabia que a filha sabia como provocar sangramentos como aquele para se fazer de vítima, então disse que não tinham vergonha e exigiu que os dois se apartassem.
Lambert gritava que a partiria em pedaços... Nadine se mostrava indignada por ter apanhado por causa do brinquedo do outro... Anne explicou que nenhum dos dois estava com a razão... Em nenhum momento Nadine admitiu que alguém ali pudesse ter se preocupado com a sua segurança... Disparou que, para Lambert, tanto fazia se ela estourasse os miolos porque ele bem sabia o que era enterrar uma namorada... Sem saber o que dizer, o rapaz disse que ela havia traído Diego com todo o exército americano... Nadine lembrou que o pai dele havia entregado Rosa aos nazistas.
Depois de breve silêncio, Lambert proferiu que não queria mais vê-la... Subiu na moto e partiu... Nadine lançou-se na relva e gritou como uma louca.
Assim termina o capítulo VI de Os Mandarins.
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto

sexta-feira, 25 de julho de 2014

“Os Mandarins”, de Simone de Beauvoir – depois do diálogo com Anne, Lambert procurou mudar sua postura em relação à Nadine; jantar calmo; Nadine retorna de Paris e dispara agressões contra o namorado

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Pedir paciência para Lambert era demais... Tudo o que ele gostaria era ter a certeza de que Nadine o considerasse importante e que não o detestasse... Não era fácil sentir-se desprezado e ser visto como um intelectual sem criatividade pela própria namorada.
(...)
Mais uma vez Anne tentou elevar o seu moral, garantiu que Nadine o amava e que só se interessava por quem tem conteúdo... Sim, Lambert podia ficar tranquilo quanto a isso... Nadine era muito carente e necessitava de mais manifestações amorosas de sua parte.
Enfim, Lambert demonstrou animação. Disse que se esforçaria para convencê-la de seu amor... Tudo se tornaria diferente porque a ideia de se sentir amado o transformaria.
(...)
Depois da “sessão” com Lambert, Anne retirou-se para escrever ao amado Lewis... Quanta angústia! A leitura das cartas de Brogan traziam-lhe lembranças de momentos felizes que passaram juntos... Os envelopes e as amareladas folhas transpiravam um pouco do ambiente onde se amaram... Para a sua infelicidade, ela sabia que não podia retribuir o mesmo calor, as mesmas promessas e manifestação de desejo de se reencontrarem em breve... Sua realidade incluía Robert, Nadine, os pacientes...
Para Brogan era natural escrever que a aguardava ansiosamente... Para Anne não havia como considerar o desejo de reencontro, mas tão certo quanto isso era o seu pertencimento a uma “outra vida”... Ela sabia que o reencontro não seria para breve e que “nova separação” era uma certeza.
O envelope no qual Anne depositou sua carta seria tocado pelas mãos que ela tanto conhecia e desejava... É claro que Brogan era um tipo de carne e osso com o qual criara o vínculo afetivo, porém não eram poucas as ocasiões em que desconfiava que o amado fosse apenas uma “criação de seu coração”...
As nuvens escuras baixaram rapidamente... Anne deixou sua carta sobre a mesa.
(...)
Enquanto acendia a lareira telefonava para Lambert, convidando-o para jantar... Embora não houvesse nenhuma garantia de que o momento de refeição reunindo Robert e o rapaz pudesse ser tranquilo, a paz reinou durante a refeição porque, além da ausência de Nadine, nenhum dos dois entrou em “questões polêmicas”...
(...)
Depois Dubreuilh se dirigiu ao escritório. Lambert ajudou Anne a retirar a mesa... Nadine apareceu... Ela estava completamente molhada... Foi logo dizendo que não pretendia jantar porque estivera com Vincent e Sezenac e que estava muito bem alimentada... Depois disparou sem a menor cerimônia que Vincent partilhava de sua opinião a respeito dos lamentáveis campos soviéticos... Uma campanha de denúncias serviria apenas para dar crédito “aos burgueses”.
Lambert respondeu que, pelo visto, o rapaz iria insistir com Henri para que nada fosse publicado... Nadine deixou claro que sua torcida era para que isso realmente ocorresse... Então Lambert anunciou que, em conversa com Perron, adiantara que se nada fosse divulgado, deixaria L’Espoir.
Nadine não perdeu a chance de provocá-lo em relação à ameaça de abandonar a equipe de L’Espoir... Lambert se mostrava gentil depois da conversa com Anne e não queria discutir com a moça. Disse apenas que não acreditava que ela o tivesse em tão baixa consideração... Nadine fez questão de dizer que talvez não pensasse tão bem ao seu respeito como ele acreditava.
Lambert disse que ela não precisava demonstrar tanta agressividade... Nadine disparou que ele não havia sido delicado ao permitir que ela fosse sozinha a Paris... O rapaz argumentou que ela parecia não querer a sua companhia; a moça respondeu que ele bem poderia propor acompanhá-la.
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto

“Os Mandarins”, de Simone de Beauvoir – uma tempestade se aproxima; Nadine retira-se para Paris; Lambert desabafa com Anne; sobre Diego e Rosa; relatos contraditórios

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A tempestade se aproximava...
Nadine fez questão de mostrar que estava irritada. Estava claro que o casal não se entendia e que os pontos de vista de um e os da outra pareciam não ter vínculo algum. Mas ficou evidente que a discussão a respeito do livro que Lambert lia era apenas um pretexto para extravasarem o sentimento de insegurança que amargavam.
(...)
Entediada, Nadine pediu a chave da máquina garantindo que poderia passear sozinha de moto pela floresta. Lambert respondeu que não permitiria porque, além de ela não saber pilotar, a região poderia ficar muito perigosa por causa da chuva que cairia.
A briga começou... Nadine gritou que estava claro que ele não se importava com a sua segurança e que, mais que isso, egoísta como era, não queria “dividir a motocicleta”... Exigiu a chave, mas Lambert nada disse. A moça jogou o cesto para Anne ao mesmo tempo em que sentenciava que o ambiente estava muito desagradável por ali e, assim sendo, o melhor que tinha a fazer era passar o dia em Paris...
Ficou claro que o desfecho era pesado demais para Lambert. Ele sabia que a namorada se encontraria com amigos que ele não aprovava... Tinha certeza de que ela se ofereceria a eles.
(...)
A moça se retirou... Então Lambert principiou um desabafo com Anne... Ele procurou se justificar ao dizer que Nadine podia levar mais em consideração os seus sentimentos... Anne o consolou dando a entender que sua filha era a culpada, já que “por um nada” se irritava.
Anne observou o moço, analisou os seus gestos e concluiu o quanto ele parecia indefeso... Então ela falou-lhe sobre o passado de Nadine... A explicação podia estar na infância da garota... Na sequência tratou de seu relacionamento com Diego... Neste ponto da conversa, Lambert quis saber das qualidades do jovem que Nadine conheceu tão bem, sua inteligência e sensibilidade poética... Anne garantiu que a filha não é dada a admirar aqueles que a amam. Em vez disso, para ela, o que conta é a certeza de exercer posse sobre eles.
Lambert falou com convicção que amava Nadine... Anne argumentou que talvez ela não estivesse tão segura a este respeito... Talvez se sentisse comparada à Rosa... O moço rebateu aquela hipótese declarando que o seu sentimento por Nadine era muito maior do que havia cultivado por Rosa.
Anne o fez refletir sobre a necessidade de Nadine ouvir dele aquelas afirmações... Lambert disse que aquelas coisas eram indizíveis e que o mais natural seria Nadine perceber, até porque ela sabia que o último ano de sua existência havia sido de total devoção a ela... Anne quis que ele entendesse que, para a sua filha, aquilo podia não passar de mera camaradagem.
(...)
Por incrível que pareça, Lambert argumentou que a namorada sempre demonstrava insatisfação durante as noites em que nada de “mais quente” se passava entre eles... Recordando-se da conversa com Nadine, Anne perguntou ao moço se era assim mesmo, se era Nadine quem se oferecia e exigia os “contatos mais quentes”.
Lambert confirmou o assédio de Nadine... A contradição entre o que cada um dizia era evidente... Anne tentou esclarecer que Nadine era mal resolvida em relação à sua feminilidade (falou sobre “sensação de mutilação”) e sugeriu que Lambert se esforçasse por se tornar mais paciente.
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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