Maria Soldado lamentava não poder contar com o rádio... Ela gostaria de ouvir as narrativas sobre o heroísmo paulista e os exemplos dos que se entregavam à causa com total abnegação, como o agricultor de Cunha, Paulo Virgílio.
Não se pode dizer que o jovem soldado aspirante a jornalista pudesse substituir o noticiário ao qual Maria se acostumara... É claro que ele estava muito empolgado com a revolução e o proselitismo que se fazia dela... Estava bem informado sobre as frentes de combate, mas ele não tinha noção de que os resultados dos confrontos eram totalmente desfavoráveis.
(...)
O rádio fazia muita falta à
Maria...
Sem ele, ela não podia sequer imaginar que no sul do
país estava ocorrendo um confronto entre as tropas do advogado Borges de
Medeiros e as do general Flores da Cunha...
O general interventor do estado havia prometido combater em favor dos
paulistas e de seu movimento constitucionalista, mas recuou nos últimos
instantes... Medeiros contava com cerca de 450 homens... Os combates entre as
duas forças se deram em território paranaense.
Em Piratini, o grupamento de Medeiros utilizou táticas
de guerrilha na Batalha de Cerro Alegre... Quase metade dos combatentes
rebeldes terminou morta, porém o comandante sobreviveu e foi feito prisioneiro.
Faustino registra as palavras de enaltecimento que eram proferidas por
radialistas ao aliado do sul do país:
Não, gaúcho, não te entregues, não sucumba em Cerro Alegre, nas
bandas de Piratini. És forte. És rei dos guerreiros, heroico Borges de
Medeiros, São Paulo confia em ti!
(...)
No momento em que o batalhão marchou para o trem que o conduziria à
frente de combate no Paraná, os legionários receberam abraços e ouviram
calorosas palavras de incentivo... Maria Soldado não tinha parentes na capital,
mas também ela recebeu várias homenagens...
O texto dá a entender que as pessoas notavam que ela se destacava no
grupamento... Elas se concentravam para avistar pais, irmãos, maridos e
filhos...
Mulheres e crianças a
abraçaram... A mãe de um dos soldados a tratou como se fosse sua filha e disse
que ela não devia ”dar moleza aos macacos de Getúlio”... Não havia dúvida de
que Maria chamava a atenção... Diziam-lhe para tomar cuidado e “retornar
inteira”...
A partida do trem foi
emocionante... Alguém desejou que Deus acompanhasse os “Pérolas Negras” e no
mesmo instante percebeu-se que o tratamento carinhoso foi adotado por toda a
população. O próprio Vicente Ferreira se referiu aos soldados dos batalhões da
Legião Negra como “os Pérolas Negras”...
Faustino, a partir
das reflexões de um intelectual instalado na primeira classe do mesmo trem,
adverte que as pérolas negras têm “valor inestimável no mercado das pedras
preciosas”, mas elas são o resultado de “enfermidade que a ostra sofre”... As “pérolas”
que partiam para a frente de combate sofriam “grande enfermidade social”.
(...)
Em Itapetininga os vagões que levavam os soldados foram separados
daqueles que acomodavam passageiros comuns... O grupamento do qual Maria fazia
parte seguiu para a estação de Ligiana, nas proximidades de Buri (estado de São
Paulo).
Mal desembarcaram, travaram
os primeiros confrontos. O resultado foi favorável à Legião e os combatentes
seguiram adiante... Em Buri ocorreu novo combate, e dessa vez Maria feriu-se.
O texto a coloca numa condição de verdadeira
heroína... Primeiro porque se recusava a retirar-se da frente de batalha;
depois porque, após passar por hospital em Sorocaba, voltou ao batalhão, tornou-se
líder e levou os companheiros à vitória.
(...)
A ficção nos apresenta essa situação... Os feitos de Maria Soldado seriam
comparáveis ao da Joana D’Arc do século XV...
Os inimigos somavam quantidade infinitamente maior,
e isso sem levar em conta a superioridade bélica das tropas fiéis a Getúlio...
Assim, a “saga de Maria Soldado” seria exaustivamente narrada pelo rádio e se
tornaria importante peça de propaganda... Principalmente para incentivar mais
mulheres e negros a se engajarem na causa da revolução.
Leia: A
Legião Negra. Selo Negro Edições.
Um abraço,
Prof.Gilberto