sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

“A Guerra do Futebol”, de Ryszard Kapuscinski – desconfianças dos tradicionais políticos do GPRA em relação a Ben Bella e Boumédiène; Exército de Libertação Nacional, seu ativismo político e apoio à eleição de Ben Bella; dramas das nações de terceiro mundo e ciclos ditatoriais; aspectos positivos do governo Ben Bella listados por Kapuscinski

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/01/a-guerra-de-independencia-da-argelia_14.html antes de ler esta postagem:

Vimos que o Exército de Libertação Nacional comandado por Boumédiène permaneceu por um bom tempo impossibilitado de atravessar as barreiras instaladas nas fronteiras “inexpugnáveis” tanto da Tunísia (ver http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/01/a-guerra-de-independencia-da-argelia_12.html) como no Marrocos...
Seus soldados estavam prontos a se dedicar também à luta política... Aliás, esse era o tipo de formação que as tropas revolucionárias recebiam... Numa das mãos o fuzil, e na outra a “bandeira de agitador”...
Os mais experientes integrantes do Governo Provisório e da FNL avaliavam os comandados de Boumédiène com muita precaução... Não foi por acaso que às vésperas da independência procuravam desarmá-lo. No dia 2 de julho de 1962 pediram o afastamento do comandante e de todos os oficiais mais próximos a ele...
Kapuscinski dá a entender que nem aceitavam com total convicção a posse de Ben Bella!
Mas sabemos que os dois eram firmes em seus propósitos e sem a menor intenção de se afastar da vida pública... Então, de certa forma, foi natural que ocorresse uma aliança entre Boumédiène e Ben Bella... Sozinhos não teriam condições de vencer a situação... Juntos, “passaram a depender um do outro”.
(...)
Kapuscinski garante que a relação entre Ben Bella e o Governo Provisório não era das mais afinadas... Em contrapartida, seu discurso em defesa do “conceito de um exército politizado” atraía os comandados da armada chefiada por Boumédiène... Seu Exército de Libertação Nacional era a “força coesa” na Argélia dos primeiros anos de independência. Ficou entendido que a presidência do país só poderia ser exercida por alguém que pertencesse ao Exército... Aos poucos, a maioria concordou com o nome de Ben Bella...
O apoio do Exército foi fundamental para a sua posse, mas desde então ficou claro que os militares estavam de olho nos atos do presidente.
(...)
Kapuscinski discorda do modo como se referiram aos dois personagens aos tempos do golpe... Em sua declaração “exaltada e demagógica” de 19 de junho de 1965 (dia do golpe), os golpistas descreveram Ben Bella como “um demônio”... O L’unitá chamou Boumédiène de “reacionário”...
Para o autor de A Guerra do Futebol os dois eram patriotas e honestos... Contudo os países de “Terceiro Mundo” pareciam padecer de dramas marcados pela luta de pessoas imbuídas de nobres intenções (são citados Lumumba, Nehru, Nyerere e Sékou Touré), sempre incompreendidas e alvos de críticas e conspirações.
Esses países, com passado marcado pela exploração colonialista, padeciam de muitas outras dificuldades... Seus povos foram vilipendiados pelos imperialistas e sofriam com o analfabetismo, o “fanatismo religioso, a cegueira tribal, a fome crônica, o desemprego”...
(...)
Para Kapuscinski, o que estava acontecendo na Argélia parecia sintomático do que ocorria nas demais nações de terceiro mundo...
As lideranças se percebiam minúsculas perante todas as dificuldades que se lhe apresentavam... Não poucos trilhavam a “estratégia da ditadura” para combater os males... Mas toda ditadura sempre provoca oposições... E não raramente elas recorrem a golpes de estado...
Então se tratava de um ciclo... O atraso imposto àquelas nações havia produzido condições que as levavam a regimes ditatoriais que se repetiam com certa regularidade.
(...)
Ben Bella havia governado por três anos... Seus opositores garantiam que ele pouco fizera...
Kapuscinski não compartilha dessa avaliação... Afirma que apesar de ser um tipo complexo e instável, que nem sempre se mostrava coerente, Ben Bella era um dirigente excepcional... A análise de algumas ações de sua administração interrompida dá conta que ela foi positiva:
* Sua posse conciliou grupos com interesses opostos... Isso evitou a continuidade de confrontos numa nação já tão sofrida com a guerra;
* O país passou por uma reorganização complexa, dado que havia saído arrasado da guerra de independência... Assim, a vida das pessoas retomou certa normalidade;
* A economia da Argélia estava se refazendo a partir da nacionalização de terras e indústrias, e essa alternativa produzia bons resultados;
* A Reforma Agrária estava em curso; sua experiência de Socialismo foi “ousada e original”, pois preservou a “superestrutura islâmica”;
* A Argélia assumiu uma condição de liderança... Tornou-se referência não apenas para os países africanos, mas também para as demais “nações de terceiro mundo”;
* Com Ben Bella, a luta contra o imperialismo tornou-se fortalecida.
Leia: A Guerra do Futebol. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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