Então aconteceu de, por breve tempo, na área dos iorubas, conviverem duas administrações: a “oficial”, determinada pelo governo central; e aquela que os rebeldes da UPGA queriam impor.
Depois os membros do “governo rebelde majoritário” começaram a ser presos... A UPGA reagiu deflagrando o confronto contra todos os que simpatizavam com o pessoal do NNDP.
(...)
A guerra adquiriu formatação horrenda. O vandalismo predominou...
Plantações e moradias tornaram-se alvos de incendiários... As estradas ficaram
repletas de cadáveres e veículos carbonizados... Os vilarejos e as florestas
iorubas arderam em chamas.
Disseram
a Kapuscinski que certas estradas (aquelas que levavam aos territórios iorubas)
eram proibidas aos brancos... Garantiram que os que ousassem atravessá-las
terminariam mortos.
O correspondente de
guerra precisava conferir... Ele não deixaria a oportunidade passar porque esse
era o seu estilo de cumprir o ofício de repórter.
(...)
O
caminho percorrido era marcado pelas belas paisagens que tanto chamam a atenção
dos ocidentais... Mas a sensação de que a qualquer momento poderia ocorrer
algum atentado fazia com que a viagem adquirisse ares temerários.
O autor registra que
não há como não se encantar com as noites do Saara... Seu relato emocionado
garante que em nenhum outro lugar do mundo as estrelas são “gigantescas”, como
no deserto... “Elas se balançam sobre a areia como enormes candelabros”... “A
noite no Saara é tão verde quanto um prado europeu”.
(...)
Depois de passar por
determinada colina, Kapuscinski dá a entender que não teria como retroceder...
Enfim se posicionava em área dominada por rebeldes.
Logo pôde ver uma
barreira em chamas... Não havia como passar pela estrada, pois os rebeldes
haviam colocado fogo em troncos que arrastaram para o meio do caminho...
O polonês notou pelo
menos dez jovens armados com espingardas, facas e facões... Eles vestiam as
cores da UPGA (azul e branco) e traziam a fotografia de Awolowo, seu endeusado líder
político.
Os tipos se comportaram de modo violento. Estavam tão agitados que suavam
a ponto de ensopar as vestes. Pelo visto haviam fumado haxixe, “pois seus olhos
estavam turvos e eles pareciam enlouquecidos”.
Arrancaram Kapuscinski do veículo... Gritaram a sigla do partido
enquanto mantinham pontas de facas em suas costas... Ameaçam golpear a cabeça
do gringo com os facões... Os que se posicionaram mais afastados mantinham as
armas de fogo apontadas contra ele... Não havia como escapar!
(...)
Kapuscinski lembrou-se de experiências
anteriores, quando (no Congo) teve a vida ameaçada por armas encostadas em seu
corpo... Então decidiu permanecer imóvel, escondendo qualquer ponto fraco,
inclusive para não provocar ainda mais a ira dos agressores...
Dessa forma,
escondendo suas fraquezas e temores, o polonês esperava sobreviver. A única
coisa que aqueles tipos sabiam é que ele se tratava de um branco... É claro que
não teria chances de explicar que não se tratava de inimigo, até porque (para
eles) qualquer branco devia ter vínculos com os antigos colonizadores, de quem
queriam se vingar por todas as humilhações sofridas no passado.
(...)
É bom que se saiba que a movimentação rebelde que estava ocorrendo não
tem relação direta com o processo de independência, que aconteceu em 1960.
Outras
postagens apresentarão um quadro mais detalhado a respeito de Obafemi Awolowo.
E também sobre as divergências entre os grupos étnicos aos quais os iorubas
ofereciam resistência.
Leia: A
Guerra do Futebol. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto