sábado, 24 de setembro de 2016

“O Homem Duplicado”, de José Saramago – nenhuma coisa é simples e não nascemos céticos; de “falsear” e “falsificar”; da necessidade que temos de “novos” termos para explicarmos certas sensações e juízos

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/09/o-homem-duplicado-de-jose-saramago-por.html antes de ler esta postagem:

A reação de Maria da Paz não podia ser diferente...
Além de estranhar a proposta, alegou sua falta de condição de discorrer a respeito da temática. Um absurdo! Recusou-se no mesmo instante.
Tertuliano explicou-se melhor... Disse que na verdade ele mesmo escreveria a carta. Só que em nome dela e com as informações sobre o seu endereço.
Ainda sem entender o propósito, Maria o provocou dizendo que a iniciativa protegeria a dignidade do professor... Tertuliano respondeu que ela não precisava usar de ironia, era só entender que se tratava de “uma questão de escrúpulo”.
Ele insistiu que a outra precisava confiar mais nele... Ela bem sabia que era amada por ele... Maria disse que quando o ouvia dizer que a amava era levada a considerar a afirmação, mas não escondeu que depois tinha de se perguntar se era mesmo verdade.
Tertuliano não titubeou... No mesmo instante disse que ela podia crer... Era verdade!
(...)
Maria questionou se, ao telefonar-lhe, o namorado pretendia falar-lhe sobre seus sentimentos em relação a ela... Ou se havia sido para convencê-la a respeito da carta.
O professor argumentou que a ideia de falar-lhe a respeito da carta surgiu no meio da conversa... Tudo bem... Não podia esconder que já havia pensado sobre a proposta.
A moça deu-se por convencida... Falou que Tertuliano podia escrever a carta... Tertuliano agradeceu e manifestou que confiava nela... Sabia que aceitaria porque era uma coisa muito simples.
Isso ela não pôde deixar passar em branco... Emendou ao seu querido que a vida ensinara-lhe que “nenhuma coisa é simples”... Às vezes até pode parecer, mas são nessas ocasiões que mais tendemos a duvidar.
Era muito ceticismo... Tertuliano insistiu que não havia motivo para isso... Maria respondeu que ninguém nasce cético... Mas esse diálogo não teve prosseguimento, pois ele colocou ponto final sentenciando que, já que ela concordara, escreveria a carta.
Ela ainda quis saber se teria de assiná-la. O professor explicou que inventaria uma assinatura... Maria deu a dica para que, ao menos, fizesse um rabisco mais ou menos parecido com o da sua caligrafia...
(...)
Certo... Tertuliano conseguiu o que queria... Disse que se “esforçaria” na imitação dos traços... Maria soltou mais uma ironia ao advertir que “quando se começa a falsear nunca se sabe aonde chegará”.
Ele entendeu e a corrigiu. Manifestou que, em vez de “falsear”, ela pretendia dizer “falsificar”.
Ainda havia ironia nas palavras de Maria... Ela agradeceu a retificação e sustentou que talvez pretendesse utilizar uma palavra que concentrava os dois sentidos... O professor respondeu que não encontrava palavra que reúne em si “o falsear e o falsificar”.
Mas não era estranho? Maria argumentou que se o ato existe, deveria haver uma palavra que pudesse expressá-lo.
Tertuliano, sempre com uma resposta pronta na ponta da língua, disse que as palavras que utilizamos e as que ainda necessitaremos estão contidas nos dicionários... A moça redarguiu insistindo que os vários dicionários juntos não apresentam sequer a “metade dos termos de que precisaríamos para nos entendermos uns aos outros”.
Ele quis um exemplo... Maria falou sobre a experiência daquele momento específico... Disse que não encontrava palavra que pudesse expressar o que estava sentindo a respeito dele e dela mesma.
Tertuliano interferiu salientando que esperava que os sentimentos da namorada não fossem maus... Ela o sossegou ao garantir que havia “de tudo” em seu sentimento, mas não teria como explicar.
(...)
O rapaz disse que voltariam a falar sobre o tema num outro dia...
Maria entendeu que a sentença encerrava a conversa... De modo algum! Tertuliano disse isso, e garantiu que ao propor a continuação da conversa noutra ocasião não estava colocando fim à conversa... O sentido de suas palavras não era esse!
A moça pediu desculpas... O moço acabou “admitindo” que era melhor desligarem... Destacou que o diálogo estava um pouco tenso, pois cada frase que proferiam carregava “faíscas”.
Maria disse que não teve essa intenção... Tertuliano disse o mesmo... Os dois entenderam que simplesmente aconteceu de a conversa encaminhar-se daquela forma...
Ele quis finalizar dizendo que era momento de desejarem-se boas-noites e sonhos felizes... Voltariam a conversar, ela podia ter certeza...
Ela disse que ele podia ligar quando quisesse...
Assim seria... Tertuliano garantiu isso e arrematou com um “Gosto de ti”.
Maria da Paz respondeu que ele já havia dito antes.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/09/o-homem-duplicado-de-jose-saramago_35.html
Leia: O Homem Duplicado. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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