sexta-feira, 21 de outubro de 2016

“O Homem Duplicado”, de José Saramago – noite de tormentos; é preciso encontrar o homem; obviedades para sustentar a razão; não é possível que numa sociedade dotada de aparelhos despertadores existam duas pessoas idênticas

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/10/o-homem-duplicado-de-jose-saramago-em.html antes de ler esta postagem:

Como se vê, Helena revelou toda sua preocupação ao marido... Ela estava bem assustada com a história.
Antônio procurou mostrar-lhe que tudo se resolveria... O tempo passaria e os fatos seriam assimilados por eles sem maiores traumas.
A mulher admitiu que o seu estado de pânico podia ser explicado por um pressentimento que ela não sabia bem o que era. Ela tremia ao mesmo tempo em que Antônio perguntava se seu pressentimento era algo bom ou mau.
Ele a abraçou... Ela encolheu-se, fechou os olhos e deitou-se no sofá. Antônio quis diverti-la ao dizer que quando se tornasse um ator de “primeira linha” poderia chamar o Tertuliano para fazer as cenas mais desagradáveis e perigosas... Ninguém perceberia!
Helena implicou também com o gracejo do marido... Disse que os dublês de cinema entram em ação ao serem chamados... Aquele tipo havia se intrometido “do nada” em suas vidas.
Antônio sugeriu que ela procurasse algo agradável para passar o tempo... Helena insistiu que não tinha interesse de ler ou assistir à televisão... Preferiu retirar-se ao quarto para dormir.
(...)
Uma hora depois ele também se deitou... Apagou a luz... Tinha certeza de que os olhos fechados da esposa não significavam que ela estivesse dormindo... Ao seu lado ele também não dormiu, pois ficou a remoer os temas que havia conversado com Tertuliano... Pensou nas frases do outro e nos sentidos que elas podiam esconder.
Para a sua infelicidade, muitos pontos ressurgiram do prolongado diálogo... Os iguais morreriam no mesmo instante? O espelho nos revela uma imagem virtual ou aquele que nos olha a partir do espelho é real? E o que pensar sobre os temores de Helena?
A noite avançou... Antônio Claro não conseguia dormir... Concluiu que a situação devia ser resolvida o quanto antes. Teria de falar pessoalmente com Tertuliano... Não teria como escapar dessa desagradável situação.
Depois dessa conclusão, dormiu.
Também Helena dormiu... Enfim a sensação que a dominou foi a de que nenhum fantasma se instalara entre ela e o esposo...
(...)
Ela pôde descansar por duas horas...
Despertou. O quarto estava na penumbra... Ouviu a respiração do marido...
Percebeu que suas preocupações não a haviam deixado completamente. Apurou os ouvidos e sentiu que podia ouvir outra respiração no apartamento.
Não conseguiu definir a origem... A respiração podia vir de qualquer cômodo... Podia vir de algum ponto atrás da porta... Alguém havia entrado na casa? Estaria ali no mesmo quarto?
Estava prestes a acordar o marido... A sensação a deixara apavorada... Porém no último momento enfrentou o medo e concluiu que aquilo só podia ser o reflexo de um sonho como esses que às vezes temos... Só podia ser isso.
Quantas vezes as pessoas associam esses eventos a premonições ou “avisos do além”? Helena entendeu que aquilo só podia ser uma fantasia que estava perturbando a sua cabeça... Não era possível que alguém idêntico ao marido lhe apareceria fazendo com ela tudo o que ele lhe fazia e da mesma maneira.
Fantasia... Apenas isso. Uma “louca fantasia”.
Certamente o dia seguinte seria de absoluta normalidade... O relógio despertaria e o dia fluiria... Todos sabem que duas pessoas não podem ser “exatamente iguais” uma à outra.
Helena tinha de pensar dessa forma... Sua saída para fugir do desespero foi agarra-se às obviedades...
Todavia sabemos que não era bem esse o caso.
(...)
Helena acordou antes do despertar do relógio. Travou-o para que o marido continuasse a dormir sossegadamente.
Aproveitou a quietude para ordenar as ideias... Precisava convencer-se de que as assombrações da noite mal dormida haviam se afastado definitivamente. A razão devia prevalecer.
Achou absurdo que as aberrações típicas de pesadelos a tivessem incomodado tanto... E quanta aberração! Imaginar um estranho nu e fisicamente idêntico àquele que dormia ao seu lado!
Mas não havia motivos para se censurar porque aquele delírio todo tinha a ver com algo que extrapolara a razão...
O dia amanhecia e ela era “senhora de si”...
As alucinações da noite haviam ficado para trás.
Leia: O Homem Duplicado. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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