Poderíamos esperar que a leitura dos registros de 24 e 25 de dezembro de 1895 fornecesse elementos a respeito de comemorações de Natal, refeições diferenciadas ou trocas de presentes entre os familiares de Helena...
As redações evidenciam amor e companheirismo nas relações entre os familiares... Isso não se devia a nenhuma “situação especial”.
Como vimos, os dias eram vividos na maior simplicidade. Ninguém deixava de cumprir as tarefas do cotidiano...
(...)
No
dia 25, as mulheres foram à beira do rio para lavar roupa... Os rapazes se
encarregaram da coleta de lenha, da confecção de vassouras, da pesca...
Dona Carolina havia
se separado do grupo para levar a refeição de seu Alexandre... A primeira parte
do dia havia sido de trabalho e foi encerrada com o almoço preparado pela velha
Luzia e por Benvinda. Todos tinham ainda muito serviço na parte da tarde.
(...)
Helena
fez comentários positivos a respeito da refeição que fizeram... Sua redação
esclarece que a mãe nunca as deixava colocar os pés na água após o almoço. Sem
maiores explicações, dona Carolina vivia dizendo que “molhar os pés depois de
se alimentar faz mal”.
A garota sempre quis
entender que mal haveria em molhar-se depois do almoço. Ela dava o exemplo dos
mineiros que tinham de entrar na água até os joelhos após a alimentação... Eles
permaneciam na água praticamente o dia inteiro! A esse respeito, sua mãe dizia
que com eles nada ocorria porque já estavam acostumados.
O raciocínio de
Helena era simples... Não podia haver nada de mal, pois era apenas uma questão
de se habituar! Todavia ela jamais se habituaria porque nunca lhe era permitido
“quebrar a regra”.
(...)
A mãe ainda não havia
retornado (há vários trechos do livro em que Helena destaca a dedicação e o
amor que dona Carolina devotava ao marido), então ela e as demais meninas resolveram
descer a margem do rio... No caminho apanharam “cativos e caramujos”... Pode
ser que tenham molhado os pés enquanto recolhiam os moluscos. Aquelas “coisas
delicadas” serviam para algo? Essa era a pergunta que Helena se fazia.
(...)
O passeio não podia ser demorado porque tinham de voltar a cuidar
da roupa seca.
Ao retornarem, encontraram dona Carolina que enxaguava umas peças
enquanto cantava “coisas ternas como só ela sabe cantar”.Helena entendia que aquela bela cantiga surgia sempre que sua mãe estava entristecida... Era “tristeza de saudade de seu Alexandre”.
Ficamos a imaginar o quanto ela sofria durante o ano todo, quando o marido só retornava para o lar aos finais de semana!
A tarefa seguinte foi a de apanhar a roupa já seca e dobrar... Algo que elas faziam com destreza e rapidez.
Mais tarde, Helena procurou um local onde pudesse tomar um banho. Encontrou um poço que ficava atrás de uma pedra. Entrou nele vestida com sua saia de algodão e começou a lavar os cabelos.
Não demorou e ela notou que incontáveis lambaris se chocavam contra as suas pernas. Resolveu pegar uma bacia, um pouco de arroz e farinha... De volta ao poço, abaixou-se colocando um pouco da ração em sua saia... Os peixes caíam direitinho em sua armadilha... Então ela se levantou, virando-os na direção da bacia.
Conseguiu “pescar vários”, e só não pegou mais lambaris porque sabia que dariam muito trabalho para limpar.
Todos comeram do peixe na refeição da noite.
Assim passaram o Natal de 1895.
(...)
Em tempo:
Já nos primeiros dias
de férias na Boa Vista, quando permanecia por um tempo sem ter o que fazer,
Helena conduzia o carneiro de seus irmãos para a mata... Renato havia feito um
carrinho que o animal puxava satisfatoriamente, então ela coletava gravetos que
podiam ser usados no rancho.
O
carneiro era muito bem cuidado... Helena procurava moitas de capim verde e
tenro para que ele se alimentasse... Durante a noite o animalzinho era
recolhido aos pés da cama de Nhonhô e Renato.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2017/07/minha-vida-de-menina-de-helena-morley_99.html
Leia: Minha
Vida de Menina. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto