Não temos substanciais notícias a respeito da viagem até o Egito...
Teodorico desembarcou na Alexandria num domingo em que se celebra São Jerônimo... Agradeceu ao “Senhor da Boa-Viagem” pelo sucesso da travessia ao mesmo tempo em que sentenciou que seus pés latinos pisavam pela primeira vez terras religiosos (e sensuais) do Oriente.
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Foi durante a viagem que conheceu o doutor Topsius.Com formação na Universidade de Bonn, este alemão era arqueólogo especialista, “sócio do Instituto Imperial de Escavações Históricas”...
Na apresentação dos registros de suas memórias, Teodorico citou Topsius e deu a entender que os dois fizeram juntos a peregrinação. Em seu desembarque na Alexandria, o doutor manifestou sua emoção por pisar o solo egípcio. Saudou o “negro Egito” e suplicou que o Deus Ftá (das Letras, da História, “inspirador da obra de arte e da obra de verdade”) lhe fosse propício.
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O
português ouviu o “zumbido científico” do companheiro sem dar prosseguimento às
suas elucubrações... Em vez disso, sensibilizou-se com o calor do ambiente e
seus aromas... Observou o cais, os fardos de lã, o precário e sujo barracão que
era a alfândega... Notou os minaretes e a revoada de pombos...Palmeiras marcavam a paisagem dominada por um palácio à margem das águas. O mais eram as areias e sua tonalidade que lembra a dos pelos de leões... Aquele deserto estava ali desde muito tempo e testemunhara a formação da antiga Líbia desde as primeiras colônias gregas e fenícias.
Os dois contrataram um veículo para o transporte até Hotel das Pirâmides... Foi nesse momento que Teodorico tratou de também invocar as divindades locais, saudou o “negro Egito” como fizera Topsius... O alemão o interrompeu e, sorrindo, acrescentou que em seu caso devia solicitar que “Ísis, a vaca amorosa” lhe propiciasse a boa estadia.
O rapaz ficou sem entender o que o companheiro queria dizer-lhe ao indicar que suas súplicas não deviam ser as mesmas, todavia admirou-o por mais essa manifestação de inteligência.
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Os dois haviam se
conhecido em Malta, numa ocasião em que Topsius media as paredes “do palácio do
grão-mestre” com seu guarda-sol.
Naquelas paragens históricas somente um cientista se dedicaria a medir
os grandes monumentos como se esse fosse um de seus “deveres espirituais” de
doutor.
E olha que a atitude do doutor despertou a curiosidade do Raposo num
momento em que este dedicava atenção a uma florista!
Teodorico se aproximou... Topsius olhou-o desconfiado
“por cima de seus óculos de ouro”, mas sua recepção foi amigável. Não havia
motivos para maiores suspeitas... O lusitano estava bem vestido, trazia um ramo
de violetas e tinha luvas perfumadas. O alemão de longos cabelos da “cor de
milho” cumprimentou-o levantando seu boné de seda preta. Teodorico fez o mesmo
com o seu capacete de cortiça... Depois disse-lhe o nome, de onde vinha e os
motivos de sua viagem à Terra Santa.
Topsius
apresentou-se... Nascera na Alemanha, era doutor e também estava a caminho da
Judeia... Viajaria ainda à Galileia por dever de ofício, pois coletava
informações para uma publicação intitulada “História dos Herodes”... Esclareceu
que toda a viagem era pontuada por sítios que o interessavam cientificamente.
Em Alexandria recolheria substancioso material para outro trabalho, “História
dos Lágidas” (reis que governaram o Egito depois de Alexandre Magno)...
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2017/10/a-reliquia-de-eca-de-queiroz-da_37.html
Leia: A
Relíquia – Coleção “Biblioteca Universal”. Editora Três.
Um abraço,
Prof.Gilberto