O vaqueiro Badú preparava Sete-de-Ouros... Pelo visto os demais já haviam partido... Como vimos, João Manico se apossou do poldro e é por isso que o burrinho pedrês sobrou para Badú, que estava muito embriagado...
Enquanto acomodava os arreios, o rapaz negociava com o animal... Seu estado não ajudava. Ele sabia que podia tomar um coice. Então, para ludibriar o burrico, passou a cantarolar uma cantiga chamada Rio Preto:
“Rio Preto era um
negro
que não tinha
sujeição.
No gritar da
liberdade
o negro deu para valentão...”
Do
lado de fora do galpão alguém gritou para ele acabar com aquela cantoria que só
servia para “chamar mais chuva”. O moço se surpreendeu, pois imaginava ter
ficado para trás. Imediatamente perguntou sobre o poldro, mas não obteve
resposta.
Antevendo confusão
entre humanos que não se entendiam e brigavam por “ciúmes e amores”, o burrinho
amoleceu as orelhas, fechou os olhos e enrugou a pele... O vaqueiro não mais
perdeu tempo e montou.
O
problema é que Badú era muito grande... Seus pés quase “arrastavam o chão”...
Ao longe um dos homens vaiou ao mesmo tempo em que perguntava se ele estava
pronto para “vender leite”... Onde estavam as latas?... Outro perguntou se era
ele quem levava o burrico...
Sem a menor condição
de reagir ou responder à altura, Badú soltou um “Cambada!”
(...)
Sete-de-Ouros
carregou o cavaleiro embriagado. Este sentia que as casas à sua volta
dançavam... Logo chegaram ao fim da rua, onde começava o beco do Gentil da
Ponte. Neste ponto, Francolim o aguardava.
Certamente Francolim
pretendia cumprir satisfatoriamente a missão que o patrão havia lhe confiado
(ficar de olho em Badú e em Silvino)... O “secretário” antecipou-se e disse “Estava
esperando, seu Balduíno, por lhe fazer companhia”.
Badú não escondeu o
seu mau humor e foi logo respondendo que o outro correra sério risco ao se
arriscar a ser confundido com uma “assombração”. Ele podia até passar-lhe fogo!
Francolim estranhou e perguntou como poderia ser, já que o vaqueiro estava
desarmado de garrucha ou revólver. Badú não estava para conversa e vociferou
que não se importava e, além disso, não era da conta de ninguém se estava ou
não armado.
É claro que Francolim notou que o rapaz não estava em condições de
dialogar... Chamou-o mais uma vez de Seu Balduíno e resolveu dar-lhe o conselho
sobre “beber demais é facilitar”...
Sabemos bem o que Francolim queria dizer... Mas
Badú estava muito embriagado e conversa fiada era o que menos desejava naquele
momento. Por isso esbravejou que quem desejasse conversar com ele como amigo
tinha de tratá-lo por Badú, e não por “senhor”, “senhor”... Definitivamente não
gostava de cerimônias!
(...)
Francolim disse que
Badú estava em seu direito... Depois acrescentou que naquele momento representava
o “Seu Major”.
Badú respondeu que estava “cuspindo para aquela bobagem” e que não
queria mais prosa... Disse que seguia em paz, ligeiro e “sem conversa”.
(...)
Pelo
visto Sete-de-Ouros compartilhava das mesmas intenções. Não porque o cavaleiro
tivesse os meios de forçá-lo à marcha rápida, “mas por sentir, aberto adiante,
o caminho de casa, enrolado e desenrolado, até à porteira do pasto: promessa de
repouso e de solidão”.
E aconteceu que logo
as rédeas se tornaram frouxas, pois Badú adormeceu enquanto Sete-de-Ouros
seguiu pelo caminho. À certa distância, Francolim resmungou para si mesmo que aquele
era um vaqueiro ignorante e mal-agradecido.
(...)
A
atmosfera já era de início de escuridão...
Os sapos do caminho
coaxavam... Eventualmente ouvia-se “o berro solitário do sapo-bezerro”.
O
cenário era propício para quem estivesse planejando matar... Era só se esconder
atrás de uma moita... Depois era o aguardar a vítima e disparar um ou dois
tiros.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2018/04/o-burrinho-pedres-conto-de-sagarana-de_30.html
Leia: O
Burrinho Pedrês – conto de Sagarana. Editora José Olympio.
Um abraço,
Prof.Gilberto