O Major Saulo não gostou do palavreado de seu “imediato” e exigiu que ele se calasse. Voltou a falar do próprio rebanho e com orgulho garantiu que o seu gado já não cabia nos currais. Eram mais de quatrocentas reses! Lotariam dois trens destinados ao transporte de gado.
No dia anterior ele mesmo havia percorrido os cercados para escolher os animais que seriam transportados... Seus campeiros o seguiam a separar os que o patrão selecionava.
Estava tudo acertado.... Só de olhar os animais já definia o peso de cada um... Trocou telegrama com o comprador para combinar o preço. Depois veio o comunicado de que os trens já estavam na estação do arraial prontos para o transporte.
O que faltava? Faltava tocar a boiada até lá!
Este era o trabalho do dia.
(...)
Por fim, o Major
Saulo ordenou a Francolim que fosse lavar “sua cara”...
O
rapaz protestou dizendo que não era hora de “lavar cachorro”.
O patrão o corrigiu salientando
que era para ele lavar a própria cara.
Depois soltou a
conhecida risada e, voltando-se para o vaqueiro Sebastião, emendou que o tempo
de trabalho estava começando.
(...)
Era assim mesmo que ocorria na região... As muitas fazendas dedicadas à
criação de bois ganhavam dinamismo especial naquelas ocasiões. Nos dizeres do
autor, “era a mobilização anual da fauna mugidora e guampuda (relativo aos
chifres dos animais), com trens e mais trens correndo, vagões repletos,
atochados, consignados a Sítio e Santa Cruz”.
Depois vinha a época da seca e os pastos ficavam vazios... Os boiadeiros
ficavam sem trabalho e por isso se mudavam para localidades onde podiam comprar
e arrebanhar “gado magro”... Assim o ciclo prosseguia... Na época das queimadas
retornavam... Iniciava-se o repouso, depois o “primeiro sal”... Nas semanas de
lua nova dos meses seguintes forneciam a ração de sal...
(...)
O vaqueiro Sebastião
subiu a escada e se aproximou do major para demonstrar que, sim, o tempo de
trabalho começava e ele estava preparado... Via-se que o rapaz estava descalço
e que seus pés estavam cobertos por polainas amarelas, mas, de sua parte, não
sentia falta de mais nada.
Ele nem teve chance puxar
prosa porque o patrão parecia extasiado em sua atenção ao aglomerado do gado.
Milhares ainda estavam na engorda, e até o meio do ano muitos rebanhos seriam
transportados.
O Major Saulo deixou escapar as últimas
sentenças de suas reflexões: “Vai cair chuvinha fina, mas as enchentes ainda
vão ser bravas”...
Lembrou que o ano
acabava em seis... Depois voltou-se para o Sebastião e deu ordem para chamar Zé
Grande e juntar o pessoal.
De repente interrompeu sua falação porque notou algo estranho... Quis
que Francolim lhe explicasse o que estava acontecendo. Os demais também observavam
a cena desde onde estavam...
Aconteceu que quando Badú chegou, depois de ter se demorado com a
namorada, só havia uma montaria disponível: o poldro pampa... O animal já
estava com os arreios, mas demonstrava a inquietação e desconfiança dos bichos selvagens.
O
major soltou o seu riso... Francolim mostrou-se apreensivo e resumiu... A
questão era que o Silvino guardava muito ódio em seu coração porque ele também
gostava da moça que Badú estava namorando... Mas acontece que “ela não gostava mais”
do Silvino.
(...)
O patrão não queria
saber de fofocas... Disse que Francolim devia esquecer os casos... O que
interessava no momento era saber se Badú entendia de domar o bicho bravo.
Este não demonstrou
nenhuma contrariedade... Não reclamou... Observou com atenção o poldro e se
aproximou dele... Observou a cilha e viu que estava bem apertada... Ajeitou a própria
cinta e pulou no animal.
Logicamente
o poldro não gostou... Escondeu o rabo e fungou... No mais comportou-se como
uma fera... Tal como o peixe que quer se libertar do anzol... Empinou, deu golpes
de ancas, trotou lateralmente e se debateu dando a entender que dispararia a
qualquer momento.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2018/04/o-burrinho-pedres-conto-de-sagarana-de_46.html
Leia: O
Burrinho Pedrês – conto de Sagarana. Editora José Olympio.
Um abraço,
Prof.Gilberto