Henri ouviu com atenção as palavras de Lambert e procurou raciocinar a partir das suspeitas que ele podia levantar e também das informações que ele possuía sobre as atividades de alguns conhecidos... Tanto o caso Molinari (que havia sido atirado do trem no percurso entre Lião e Valence) como o de Péral não lhe traziam abalos... É claro que sua consciência apresentava-lhe Vincent e seu grupo como possíveis autores de tal atrocidade, mas ao mesmo tempo ele se recusava a alimentar aquele enredo macabro... Em sua mente surgiam “o rosto amarelo sangrando no cascalho e os olhos azuis espantados do homem”... Insistia para consigo que “só podia ter sido acidente”...
Henri lutava contra as “evidências” que teimavam martelar suas reflexões...
(...)
Volange fez referência aos
grupos de matadores que estavam atuando por toda a França... Todos já tinham ouvido
falar daqueles bandos... E emendou que eram “horríveis aqueles ódios que não
esquecem”... Disse isso ao mesmo tempo em que se despedia... Lembrou a Henri
que aparecesse um dia em sua casa, pois raramente se viam e ele tinha muito a
dizer-lhe... Mais por educação, Henri respondeu que aquilo seria possível logo
que dispusesse de tempo...
Depois que Volange se retirou, Henri quis saber se os
dias de Lambert estavam sendo de muito sufoco... O rapaz disse que, embora as
pessoas esperassem uma reação viril de um filho que acabava de perder o pai,
ele se confessava arrasado... Perron manifestou não dar a mínima para “histórias
de virilidade” (coisas de mulher...)...
Henri quis colocar um fim àquelas lamentações e ao isolamento de
Lambert... Pediu que fizesse um esforço para comparecer à reunião na casa de
Dubreuilh... O rapaz disse que, de qualquer forma, o seu voto acompanhava a
posição dele... Perron achou graça e emendou que o encontro tinha a ver com as
informações de Scriassine a respeito de um alto funcionário da URSS que havia
se evadido do país com revelações “acachapantes para o regime”... Esclareceu
também que Scriassine pretendia sensibilizar L’Espoir, SRL e Vigilance e assim
obter a divulgação do conteúdo... Lambert se animou e disse que aquilo lhe
interessava muito.
(...)
Henri e Lambert chegaram à casa de Dubreuilh. Este já
conversava com Samazelle... O parceiro de Trarieux dava a sua opinião a
respeito da importância de divulgarem aquelas denúncias antes de qualquer outro
veículo... Falava também a respeito do último plano quinquenal, lançado há
vários meses, cujo conteúdo era completamente desconhecido... E havia a
denúncia em relação aos “campos de trabalho”, algo já aventado antes da guerra
e que certamente agitaria a opinião geral...
Samazelle estava animado e não era sem uma ponta de orgulho que dizia
que o grupo do qual outrora fizera parte havia se preocupado com o assunto...
Após a guerra o mundo inteiro se voltava aos problemas soviéticos e se via na
obrigação de tomar uma posição... Entendia que eram privilegiados para poderem
tratar do problema sob uma “nova luz”.
Dubreuilh atentou àquelas palavras, mas era com cautela que
manifestava que a priori o testemunho
do foragido representava “duplicidade suspeita”. Primeiro porque o tipo havia
estado acomodado por muitos anos no regime que agora denunciava; depois porque não
era de se esperar a “justa medida” de um tipo manifestadamente inimigo do
regime.
Henri quis saber
quais informações tinham sobre o tal George... Samazelle disse que se tratava
de George Peltov, ex-diretor do Instituto Agronômico de Trebiuka... O rapaz
havia feito uma pesquisa detalhada e, assim, descobriu que fazia um mês ele
havia fugido da Alemanha Oriental.Por enquanto ficamos nisso... A próxima postagem revelará o encontro do grupo com o dissidente denunciante.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/12/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir_9.html
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto