segunda-feira, 28 de julho de 2014

“Os Mandarins”, de Simone de Beauvoir – Henri retorna da Itália; verifica a correspondência e confere os documentos comprobatórios acerca dos campos de concentração soviéticos; dilema em relação à publicação; pequenos dramas nos ensaios de sua peça; encontro marcado com Paule

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2014/07/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir-fim.html antes de ler esta postagem:

As últimas postagens nos deram uma ideia a respeito do verão vivido por Anne, Robert, Nadine e Lambert em Saint-Martin... Agora, quando o foco do texto retorna à existência de Henri, se faz necessário esclarecer um pouco sobre os movimentos de outros personagens durante o mesmo período... Paule, por exemplo, retirou-se junto a Claudie de Belzunce; Josette foi para Cannes com sua mãe, Lucie Belhomme; Henri arranjou um automóvel de segunda mão e colocou-o na estrada no rumo da Itália, onde pôde descansar a mente dos problemas que sempre se relacionavam ao SRL e a L’Espoir.
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Em seu retorno a Paris não pôde deixar de lidar com a papelada da correspondência acumulada... Em meio à bagunça encontrou o relatório enviado por Lambert direto da Alemanha, além disso, havia outro volume de documentos organizados por Scriassine... A noite de Perron, então, foi dedicada aos estudos desses densos materiais.
Os depoimentos de homens e mulheres que haviam se livrado dos campos de prisioneiros organizados pelos soviéticos não deixavam dúvidas... Eles constituíam algo bem diferente das suspeitas que se poderiam levantar sobre documentos extraídos do Reich, ou os “testemunhos de poloneses internados, e libertados em 1941”...
Henri pensou... Ele tinha conhecimento de documentos saídos de Moscou, como o relatório que apareceu em 1935 sobre os trabalhos nos campos de Oguepeú, ou o plano quinquenal de 1941, que destinava ao MVD (algo como “Ministério do Interior”) 14% “dos empreendimentos de construção”... Não havia como negar, os campos de trabalho forçado existiam de fato (entre outros: minas de ouro em Kolima; as de carvão de Norilek e de Vorduka; as de ferro de Stsrobelsk; as zonas de pesca de Komi...).
Todos esses locais eram institucionais... Difícil era saber quantos viviam sob o rígido controle e quais eram suas reais condições de vida e trabalho.
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Para Henri não havia mais como manter-se neutro... Seria preciso denunciar. Manter silêncio equivalia a tornar-se cúmplice... Como os leitores entenderiam essa postura? Havia os comunistas, que certamente lhe fariam uma oposição ferrenha... O jornal sofreria ataques agressivos...
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Pela manhã viu que operários compravam L’Espoir na banca da esquina... Ainda comprariam? Para manter silêncio em relação às denúncias teria de possuir informações consistentes... No entanto, o argumento mais forte em favor da não divulgação era o de que o regime dava o verdadeiro sentido aos campos... Diante da quantidade de provas, isso era muito pouco...Era preciso dizer aos leitores o que sabia. Essa convicção tomava conta de Henri e, se não lhe chegassem razões bem embasadas, não teria como esconder-lhes as informações.
É claro que Henri sabia de outras pressões... Mas em relação a elas podia se considerar numa trégua, dado que Robert, Lambert e Scriassine não estavam em Paris... E Samazelle também não o estava incomodando com exigências de qualquer natureza.
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É por isso que ele podia se dedicar aos ensaios de sua peça... Bem diferentes eram as pressões que enfrentava nessa seara... Salève a dirigia com rigor repleto de caprichos... Josette parecia não dar conta de suportá-los, assim buscava isolamento para choramingar... Vernon tremia a cada pedido de corte das “cenas mais escandalosas”... Já Lucie Belhomme se responsabilizara pelo figurino, mas parecia não se importar com o seu “modo de ser inconveniente”... É que havia a cena em que Josette “saía de uma igreja pegando fogo”, mas para Lulu a filha não podia ser vista em trapos (apenas elegantemente vestida como se estivesse saindo de um desfile).
Também a lembrança de Paule incomodava a consciência de Henri... Ele precisava visitá-la... Desde que a moça retornara a Paris não lhe dera nenhum sinal... Telefonou-lhe e ficou admirado com o modo como ela marcou o encontro.
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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