Enquanto Henri subia a escada pensava seriamente sobre a possibilidade de Paule ter se desapegado de seu antigo amor... Aconteceu que após a porta se abrir ele acabou se espantando ao vê-la bem transformada, sorriso no rosto, cabelos arrumados e sobrancelhas depiladas... O vestido colante que usava a tornava provocante.
(...)
Sempre a sorrir, Paule perguntou o motivo do olhar admirado de Henri...
Ele não escondeu que notava que o seu modo de vestir estava muito diferente. A
moça garantiu que mais surpresas ele teria e afirmou que havia começado a
escrever... Disse isso enquanto levava uma piteira à boca.
Essa afirmação agitou
Perron, que quis que ela contasse mais sobre aquela novidade... Paule deixou
claro que “algum dia” ele saberia... Falava e mordiscava a piteira... Para
Henri aquela encenação lembrava uma comédia desagradável, em nada parecida com
os dramas que tantas vezes a mesma Paule fez questão de protagonizar... Ele
teve vontade de arrancar-lhe a piteira e despentear os seus cabelos ajeitados...
Mas em vez disso, perguntou-lhe sobre as férias... Sem
entrar em maiores detalhes, Paule disse que passou um tempo muito agradável...
Depois foi a sua vez de querer saber o que o amigo andava fazendo... Ele
explicou que o teatro lhe tomava muitas horas, disse que Salève era um bom
diretor que se irritava por ser muito exigente... Não seria devido ao desempenho
da garota? Paule estava se referindo a Josette... Henri garantiu que a outra se
sairia muito bem.
Paule quis saber se Henri ainda estava envolvido emocionalmente com
Josette... Ele respondeu afirmativamente e garantiu que estava mesmo apaixonado...
Ela emendou que aquilo era curioso... Será que Henri acreditava mesmo que
estivesse apaixonado pela filha de Lulu Belhomme? Paule sentenciou que era
muito esquisito o modo como ele declarava o seu amor...
Essa conversa desagradou Henri... Então mais uma vez ele
perguntou sobre como tinham sido suas férias... A tudo Paule respondia com
breves palavras (esteve muito ocupada; gostou do lugar...)... De tal modo Henri
se sentiu incomodado que decidiu despedir-se... Ela não impôs nenhuma condição
e tampouco confirmou novo encontro.
(...)
Quando faltava uma semana para o ensaio geral da peça de Henri, Lambert
retornou da Alemanha... Via-se que o rapaz tinha mudado muito depois da morte
do pai... Chegou com uma série de testemunhos que havia recolhido e pôs-se a
falar freneticamente a respeito deles. Depois quis saber se Henri já se dava
por convencido a respeito das denúncias...
Pelo menos quanto ao “essencial”, Henri respondeu afirmativamente...
Lambert perguntou se ele conhecia a opinião de Robert. Então Henri deixou claro
que já fazia um bom tempo que não o via, pois Dubreuilh não saía do sítio em
Saint-Martin.
Lambert exclamou que era preciso que se apressassem a respeito das
denúncias e perguntou se havia decisão sobre publicá-las independentemente da
posição do “velho” (referia-se a Robert Dubreuilh)... Henri respondeu que o
comitê seria consultado... Depois pediu que o rapaz lhe desse oito dias de
prazo, garantindo que após o ensaio geral de sua peça falaria com Dubreuilh...
Henri finalizou dizendo que iria ao teatro e perguntou se o rapaz não
gostaria de acompanhá-lo. Lambert respondeu que havia lido a peça e que não
gostou... Além disso, como que a justificar-se, emendou que tinha muito a
fazer... É claro que Henri respeitou a crítica do amigo e não insistiu mais.
Antes de se despedirem,
Lambert fez referência a um encontro que tivera com Louis Volange, ocasião em
que falaram sobre um semanário que o outro esperava lançar... O cargo de
redator-chefe estava sendo reservado para ele... Henri percebeu que o rapaz
queria a sua opinião, então disse que conhecia até mesmo o nome do projeto, “Les
Beaux Jours”, mas desconfiava que Volange não quisesse se envolver seriamente
na direção... Lambert sentenciou que o fato de se ocuparem conjuntamente da
publicação tornava a proposta relevante.
Henri percebeu que
Lambert estava cada vez mais se aproximando do pessoal da direita...
Mas a finalização desse assunto fica para a
próxima postagem.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2014/07/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir_31.html
Leia: Decamerão. Editora Abril.
Um abraço,
Prof.Gilberto