Precisamos voltar à experiência de Isidore... Mentalmente, ele (e tantos outros) está integrado ao mestre... Está integrado à paisagem ritual e suas sensações são aquelas mesmas provocadas pelo “cenário sagrado”.
A realidade na qual se envolve é de sacrifício... A labuta da subida é acompanhada por “antagonistas” que consegue divisar pelo canto dos olhos...
(...)
Pedras são atiradas contra
Mercer (que em seu ser carrega Isidore e todos os demais fiéis que seguram os
manetes firmemente)...
A dor provocada pela pedrada é intensa... Mas a
caminhada deve prosseguir... Ela nunca tem fim... Não havia como quantificar as
ocasiões anteriormente experimentadas... O momento ritualístico também não podia
ser definido num tempo específico... Futuro, passado e presente se fundem na
escalada...
Haveria sentido em tudo aquilo? Como que a se desconectar, J.R. Isidore
revolta-se e se pergunta se o seu padecimento era justo... Afinal jamais
soubera qual a finalidade de todo aquele “sacrifício solitário”... Ao refletir
sobre essa “solidão”, a “mútua balbúrdia de todas as outras pessoas em fusão
quebrou a (sua) ilusão de isolamento”.
Isidore até se comunicou com elas... Ficou sabendo que
também elas sentiram a pedrada que feriu o seu braço esquerdo...
(...)
Na sequência conhecemos um pouco do quanto a “fusão espiritual” levava o
indivíduo a um confuso estado de consciência...
A mescla de personalidades permitiria a personificação existencial do
próprio Wilbur Mercer... Somos tentados a atribuir a construção da “viagem louca
de Isidore” em seu retorno à realidade concreta ao envolvimento de PKD com
drogas pesadas.
É claro que os que acompanhavam na escalada da colina também sentiram a agressão...
A pedrada fora das mais violentas... Ele (na verdade Wilbur Mercer) se lembra
de que houve tempos menos violentos, e até “mais felizes”...
Tudo começou quando seus pais adotivos, Frank e Cora Mercer, o
resgataram quando flutuava numa boia de borracha sobre as águas (não se recordava
do local – Nova Inglaterra ou perto do porto de Tampico, no México?)... A
infância feliz havia sido marcada também por sua capacidade de restaurar a vida
e a forma física de animais que ele tanto amava (sua existência havia sido
entre coelhos e besouros. E não importava onde eles estivessem, pois para
qualquer “mundo-colônia” ele podia ser transportado para permanecer junto aos
bichos)...
As reflexões levam-no a referências sobre assassinos que o teriam
capturado (quantas dessas informações devem ser creditadas à condição de “especial”
de Isidore?)...
Tantas agressões sofrera
que perdera as faculdades cognitivas... Continuou a praticar a ressureição de
animaizinhos mortos... Fazia isso secretamente nas florestas, mas quando tinha
16 anos uma “lei local” proibiu esse tipo de prática, que se constituía em
basicamente “reverter o tempo”... Mercer teria sido denunciado por uma anciã...
Os assassinos bombardearam o único nódulo de seu cérebro com cobalto radioativo
(Isidore e tantos outros também não passaram por agressões equivalentes ao
tempo da guerra terminus?)...
Então, atirado numa “fossa
de cadáveres e ossos mortos” teve de lutar muito para se livrar dessa terrível
condição... Durante anos, apesar de sua limitação intelectual, fez ressurgir
vários animais... O sapo e o burro eram os que mais mereciam sua estima... Mas
tanto tempo se passou que esses se extinguiram.
Foi um pássaro que chegou para ali morrer que lhe revelou sua real condição
no submundo... Apenas de modo macabro pôde se retirar dali... Os ossos ao seu
redor foram reconstituídos e foi assim que, integrado ao metabolismo de outras
criaturas, pôde ressurgir.
De fato, tudo muito confuso... Mas essa
narrativa ainda não se esgota aqui.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2014/09/androides-sonham-com-ovelhas-eletricas_30.html
Leia: Androides sonham com ovelhas elétricas? Editora Aleph.
Um abraço,
Prof.Gilberto