segunda-feira, 27 de abril de 2015

“A Legião Negra – A luta dos afro-brasileiros na Revolução Constitucionalista de 1932”, de Oswaldo Faustino – Stela Maris, uma linda garçonete; uma referência sobre a rainha Ngola Nzinga Mbande; o fugitivo John Washington, um ativista jamaicano da Associação Universal para o Progresso Negro

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/04/a-legiao-negra-luta-dos-afro_24.html antes de ler esta postagem:

Miro precisava arranjar algum trabalho... E é por isso que todos os dias ele deixava a pensão bem cedo.
Mas a situação não estava nada boa... Nenhuma companhia contratava porque as exportações estavam em baixa, assim os estivadores tinham de se virar com pequenos bicos ou amargar o desemprego.
(...)
Certo dia, enquanto perambulava pelos becos nas proximidades do porto de Santos, Miro acabou se instalando em um boteco onde marinheiros acomodados em uma das mesas riam a valer. Esfomeado como estava, não perdeu tempo e também entrou no pequeno estabelecimento.
No mesmo instante, ele ficou maravilhado com a bela atendente, uma “negra retinta, cabelos ondulados, compridos, até o meio das costas, olhos de jabuticaba, rosto e lábio finos”... A visão o fez paralisar instantaneamente.
Os animados marinheiros que bebiam cervejas e outras variedades de aperitivos eram norte-americanos... Entre eles havia um que não tirava os olhos da garçonete. O moço viu quando Miro fez o seu pedido (lanche de carne assada e suco de laranja), mas não reparou que o recém-chegado foi tomado de fascínio pela bela jovem.
A garota também se sentiu atraída por Miro, e logo os dois começaram a conversar com certa animação... Ele disse que estava na cidade em busca de emprego, que estava instalado na pensão, e que não era raro perambular de madrugada quando sentia fome...
Ela era bem tímida, mas sentiu confiança em Miro, que se espantou quando ela falou que trabalhava sozinha e que fechava o bar às dez da noite... Ela explicou que morava com o tio na parte de cima do estabelecimento...
Fazia dez anos que a mãe dela havia morrido... O tio (irmão da falecida) a socorreu. Não fosse ele e a sua existência seria ainda mais dramática, já que não tinha a quem recorrer (a mãe era solteira)...
Ela contou que o tio estava internado no hospital devido a um grave acidente... Quando revelou que se chamava Stela Maris, Miro pôs-se a falar de seus conhecimentos de etimologia... Explicou que o nome da bela tinha origem no latim e que significa “estrela do mar”.
As palavras de Miro a enchiam de vaidade... Mas não era a primeira vez que lhe falavam coisas bonitas... Ela até se lembrou de ocasião em que um oficial da marinha angolana a comparara à rainha Ngola Nzinga Mbande.

                        (também conhecida como Rainha Jinga, de acordo com Faustino, nasceu em 1583 e viveu por 80 anos... “Foi rainha dos reinos do Ndongo e de Matamba; liderou tropas de resistência aos invasores portugueses; converteu-se ao cristianismo e adotou o nome de Dona Ana de Sousa; revoltou-se contra os desmandos dos colonizadores e voltou a se rebelar; assinou tratado com a metrópole e reinseriu os ex-escravos na sociedade angolana. Depois de sua morte, cerca de 7 mil de seus soldados foram escravizados e enviados para o Brasil. O nome da Rainha Jinga ainda hoje é cantado em vários folguedos populares, como a Folia de Reis).

O marinheiro que estava interessado pela Stela Maris se aproximou... Em inglês pediu uma aguardente... Ela não entendia absolutamente nada do que os gringos pediam... Miro traduziu a solicitação e isso a deixou surpresa.
A moça explicou que sempre que aqueles estrangeiros apareciam, aquele tipo especificamente se encarregava de mostrar a ela o que eles queriam... Algumas vezes ele avançava para o outro lado do balcão para pegar a mercadoria porque ela tinha mesmo muita dificuldade de entendê-los.
Stela lembrou-se ainda de uma frase (give me two beers) que a deixou muito confusa numa das ocasiões... Miro sorriu do modo como ela pronunciou e explicou que tinham lhe pedido duas cervejas...
(...)
Estavam se entendendo, mas o marinheiro quis saber se a aguardente estava a caminho... Miro explicou a ela o que o rapaz pretendia... Enquanto ela se ocupou em encher o copo, o tipo se aproximou de Miro para conversar, pois notou que ele falava inglês.
Foi assim que Miro ficou sabendo que aquele moço não era bem um marinheiro... O tipo se chamava John Washington e, sempre conversando em inglês, revelou que se tratava de um ativista contra o “racismo institucionalizado” nos Estados Unidos... Na verdade era jamaicano e estava no Brasil há duas semanas... Contou que o líder do movimento do qual participava, Marcus Garvey, fundara a Associação Universal para o Progresso Negro, também era jamaicano e estava preso.
Aconteceu que o pessoal que fazia parte das células teve de fugir para escapar das perseguições policiais... Mesmo sendo um fugitivo, John tinha umas tarefas a cumprir...
Leia: A Legião Negra. Selo Negro Edições.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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