Henri recebeu um telegrama... Quando a secretária apareceu à porta de sua sala, logo imaginou que fosse mensagem a respeito de alguma tragédia com Paule. O doutor Mardrus o havia tranquilizado ao garantir que a senhorita Mareuil não apresentava tendências suicidas.
Ele abriu o papel e viu que se tratava de mensagem de Lucie Belhomme, que queria vê-lo com urgência na manhã do dia seguinte. Perron tentou imaginar o que poderia ser... Teve certeza de que nada tinha a ver com Josette, que estava bem de saúde e bem empolgada com a filmagem de “a Bela Suzon”, além de participar com regularidade dos eventos sociais...
Pensou em telefonar para a clínica onde Paule recebia tratamento, mas desistiu... Principalmente porque solicitaram que se mantivesse afastado da moça, pois consideravam que ele era causa da doença mental que ela sofria.
Henri nem achava que a acusação lhe pesasse tanto porque desde muito tempo Paule o elegera seu “cruel carrasco”.
(...)
Luc apareceu e interrompeu a introspecção de Henri... O rapaz aparentava
ares de desleixo... Encontrariam outras pessoas ali, entre elas Trarieux, que
ele pretendia provocar.
O moço quis saber o que
Henri pensava sobre o que fariam se Lambert confirmasse sua saída de L’Espoir...
Ele respondeu com convicção que o outro não os abandonaria... Para Luc, Lambert
estava acertado com Volange e certamente objetivava participar de seu periódico...
Os artigos de Samazelle serviram para atraí-lo e, na prática, isso significava
que perderiam a maioria no controle de L’Espoir...
Henri seguiu argumentando que Lambert lhe prometera o seu voto, assim,
não acreditava que ele os deixaria apenas para “fazer o jogo dos outros”...
Todavia concordava que certamente em algum momento ele partiria sem maiores
traumas.
(...)
Quase sempre era assim... Quando conversava com Lambert, Henri defendia
Luc... E quando tratava com Luc, defendia Lambert.
(...)
Trarieux chegou com Samazelle e Lambert... O tipo foi dizendo que a
equipe precisava ter bom senso... Para ele, não era possível que os leitores
permanecessem confusos devido às orientações contraditórias percebidas nas
comparações que podiam fazer entre os textos de Samazelle e de Perron.
Inevitavelmente, essa situação contribuiria para a perda de mercado.
Henri protestou ao dizer que já havia deixado claro que em relação à
linha editorial de L’Espoir não admitiria nenhuma pressão... Samazelle
interveio querendo mostrar que a manutenção da linha editorial era um equívoco.
Para ele não havia como manifestar neutralidade em relação aos comunistas. E disse
que estranhava a postura de Henri, tão criticado pelos militantes do PC.
Esses argumentos foram
rebatidos por Henri, que disparou que também admirava o fato de aqueles que se
posicionaram como esquerdistas terem se passado para partidos defensores dos
capitalistas, militares e padres...
Samazelle entendeu o recado
e fez a sua autodefesa... Esclareceu que estava apoiando De Gaulle, que não
podia ser classificado simplesmente como militar. Além disso, entendia que a
Igreja defendia valores que não podiam ser desprezados naquele momento... Se os
esquerdistas colaborassem com os gaullistas, o regime se faria anticapitalista.
É claro que Henri não
concordou e até brincou que era preferível ouvir aquilo a ser surdo... Trarieux
emendou que, independentemente daquelas divergências, o interesse de Henri
também devia ser o entendimento... Até porque ele corria o risco de ficar em minoria
em relação às decisões do jornal.
Henri dirigiu o olhar para Lambert, deixou escapar um leve sorriso e
garantiu que aquilo seria uma surpresa... Depois deixou claro que os artigos de
Volange não seriam publicados... Também Luc manifestou sua recusa a respeito da
impressão dos textos de Volange.
(...)
Conforme o que já se
previa, eram os dois votos de Trarieux e Samazelle contra os dois votos de
Henri e Luc. Lambert decidiria a situação... Todos se voltaram para ele...
O moço sentenciou que a publicação não era oportuna...
Samazelle protestou ao dizer que ele havia se manifestado positivamente em
relação aos “excelentes textos” de Volange. Estaria se deixando intimidar?
Lambert não se deu por acuado e repetiu categoricamente que havia sido
claro... Não lhe parecia oportuna a publicação dos textos de Volange em L’Espoir...
Luc gracejou e deu a entender que não seria daquela
vez que iriam desorganizá-los.
Trarieux não podia fazer nada... A votação era deliberativa. Então se
levantou advertindo que não deviam estranhar se L’Espoir fosse à falência
qualquer dia daqueles.
O tipo se retirou, e atrás seguiram Samazelle e
Luc.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/05/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir.html
Leia: Os
Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto