A maior parte do ensaio de Dubreuilh já era conhecida... Henri concentrou-se no final do volume, que devia ter sido elaborado após o desmantelamento do SRL.
As conclusões eram amargas... Para Robert, “um intelectual francês nada podia”... E não era difícil comungar daquelas ideias... É claro que seus artigos na Vigilance “causavam rumor”, mas não exerciam influência na vida das pessoas.
E o que dizer a respeito de seus críticos? Alguns o acusavam de comunista (um “criptocomunista”), outros o atacavam como se fosse o mais fiel agente dos capitalistas... Seu caso só podia provocar uma profunda amargura.
(...)
A situação de Henri não era diferente. Todavia ele “se
virava”, ia vivendo... Dubreuilh não podia fazer o mesmo.
Mas o homem havia radicalizado... Diferentemente de Henri, sequer
dedicava tempo à literatura... Condenou a literatura e a própria existência.
Seu humanismo, que se encaixava numa situação passada, nada tinha a ver com o
daqueles tempos, de mais realismo e pessimismo... Justiça, verdade ou liberdade
pareciam ideias do passado.
Como se adaptar ao humanismo do pós-guerra em seu
país? Seria preciso abdicar de toda estrutura que fazia parte de seu ser...
Seguramente ele não tinha “capacidade para isso”.
(...)
Para Henri, Robert Dubreuilh se considerava morto...
Isso lhe pesava... Ele se considerava culpado pela condição de
frustração do desafeto... Talvez o SRL
não ruísse se Henri permanecesse ao seu lado.
Era triste perceber que Robert se sentia isolado, decepcionado em
relação à sua produção intelectual, e duvidando do futuro.
Henri achou que deveria escrever uma carta a ele... O máximo que poderia
ocorrer era ficar sem uma resposta...
E quanto a Lambert? Também era necessário ter uma conversa franca com o
rapaz...
Essas coisas podiam ficar
para o dia seguinte...
Mas Lucie Belhomme
precisava falar-lhe ainda pela manhã. Isso também o incomodava.
(...)
No salão repleto de
tapetes e peles, Henri aguardou a mãe de Josette...
Lembrou-se que dessa vez não estava ali para experimentar os encantos da
jovem...
A própria atmosfera
anunciava que o que Lulu Belhomme tinha a dizer-lhe relacionava-se a algo pouco
agradável.
Ela apareceu trajando vestido que combinava com sua
seriedade. Henri observou-lhe o penteado, notou falta de cabelos e que o
aspecto dela era um tanto cansado e envelhecido.
Sentaram-se e ela agradeceu a sua presença. Disse que precisava de um
favor e queria que ele soubesse que o assunto que tinha a tratar também dizia
respeito à Josette. Henri imaginou que a mulher talvez esperasse que se
casassem o mais breve possível... Mas ele não entendeu porque ela permanecia
apertando nervosamente um lenço de renda nas mãos...
Estava claro que o nervosismo era desproporcional...
No momento em que ela perguntou “até onde ele estava disposto a ir” para ajudar
Josette, percebeu que a conversa não se limitaria à relação entre os dois.
(...)
Lulu “abriu o jogo” e disse que ele devia saber que elas não atuaram
como “membros da Resistência” durante a ocupação alemã... Henri respondeu que
haviam lhe falado “qualquer coisa” a respeito.
ela deixou claro que a sua Casa Amaryllis, sua reputação e
referência no mundo da moda se deviam à submissão aos alemães. Ela emendou que
se não tivesse se sujeitado a eles nos tempos da ocupação não teria como salvar
Josette.
Não era sem uma ponta de lamento que dizia essas coisas... Uma mártir
que após a Libertação sofreu muitos aborrecimentos... A tudo esquecera, pois
pretendia dar prosseguimento à vida.
Mas havia empecilhos que se
avolumavam como se fossem engendrados por fantasmas.
Era sobre eles que Lucie queria tratar com
Henri.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/06/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir-para.html
Leia: Os
Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto