sexta-feira, 30 de outubro de 2015

“Estado de Sítio”, de Albert Camus – terceiro ato – a verdadeira identidade da secretária; Morte e sua indignação com o procedimento mecânico imposto por Peste; a afeição pelo corajoso Diogo; o momento derradeiro do jovem se aproxima; Vitória sofrerá

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/10/estado-de-sitio-de-albert-camus_30.html antes de ler esta postagem:

A secretária apresentou-se no mesmo instante em que foi convocada.
Sua fisionomia fatigada mudou completamente...
Enfim sua verdadeira identidade foi revelada. Seu rosto envelhecido... Ela era a própria Morte!
(...)
Peste chamou a atenção de Morte... Reclamou que, diferentemente dele, ela não manifestava o ódio próprio daqueles que necessitam de “vítimas frescas”.
Morte confirmou... O ódio não a sustentava e não estava em suas funções... Argumentou que, de certa forma, aquilo era resultado do “método” de Peste (que se apoiava em suas fichas de organização). O tratamento dispensado aos mortais era tão “mecânico” que se tornava impossível perceber se eles inspiravam algum tipo de sentimento...
Peste tinha pressa... Apontou para Diogo, que já estava de joelhos, e pediu para ela cumprir a sua função.
Morte deixou claro que não deixaria de exercer o seu ofício... Todavia manifestou que não se sentia “muito à vontade”... É claro que Peste vociferou e quis saber o motivo de suas ordens não serem prontamente atendidas.
(...)
Por essa o ditador não esperava... Morte explicou que também possuía memória. Disse que havia sido livre no passado, e que as pessoas a associavam ao acaso. Por isso não a odiavam... Viam-na como a senhora “que termina tudo, fixa os amores, que dá forma a todos os destinos”.
Que tipo de mudança drástica se operara em Morte desde que passara a trabalhar com Peste? Outrora podia ocorrer de manifestar compaixão... Mas a parceria com o facínora a tornara “serviçal da lógica e do regulamento”...
(...)
Mas então havia quem pedisse socorro à Morte?
Sim. Ela mesma confirmou que os desvalidos e “menos fortes do que a desgraça” dirigiam-lhe clamores. Ou seja, quase todas as pessoas.
Morte disse que trabalhava no consentimento... Existia à sua maneira... Tratava-se de uma “relação natural”, bem diferente do mecanismo adotado por Peste, que levava os viventes listados a negá-la “até seu último suspiro”.
Essas eram as razões que talvez explicassem a afinidade de Morte em relação ao Diogo. Ele a escolhera livremente...
A velha senhora disse que amava os que marcavam encontro com ela... Pode ser que em seu interior admitissem piedade por ela.
(...)
Peste irritou-se. Vociferou que ninguém ali precisava de piedade.
Com serenidade, Morte respondeu que apenas “aqueles que não sentem compaixão por ninguém” precisavam de piedade.
O amor por Diogo podia ser entendido como a inveja que Morte sentia dele. Para os conquistadores como Peste e ela própria, o amor tomava a miserável “forma de inveja”.
Peste devia saber! Era por isso que os viventes lamentavam-nos como entidades.
(...)
Aquela que fazia o papel de eficiente secretária de Peste durante suas investidas nas realidades dos pobres mortais teve de ouvir um “calai-vos”!
Como que a justificar-se, ela relatou que não era difícil de entender que (de tanto matar) terminasse amando a inocência dos sentenciados...
Morte manifestou sua repugnância em relação às sombras... Invejava aqueles miseráveis, e apontou para o corpo inerte de Vitória dizendo que ela voltaria a viver “para soltar gritos de animal” (porque teria de passar o resto de seus dias sem a companhia do amado Diogo).
Vitória viveria amargurada... Mas Morte levou em consideração que a jovem se apoiaria no próprio sofrimento. Esse tipo de drama era-lhe digno de inveja.
(...)
Diogo estava quase caído. Peste o reergueu porque seu fim não podia se efetivar se Morte não o cravasse.
Estava difícil para o ditador admitir todo o sentimentalismo que se apossou de Morte... Mas ele sabia que “o que é preciso” seria executado, pois ela conhecia a regra e a sua função.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/10/estado-de-sitio-de-albert-camus_31.html
Leia: Estado de Sítio. Editora Abril.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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