O voo do DC-3 para Santa Rosa de Copan foi dos mais
assustadores.
Estava na cara que o aparelho não passava de um
improvisado transporte de passageiros, já que o seu interior era desprovido de
qualquer tipo de assento... Originalmente se tratava de um avião que
transportava cargas.O aparelho era extremamente instável... Os jovens pilotos não conseguiam mantê-lo em “linha reta”, e se divertiam ao notarem que os jornalistas tinham problemas para permanecer de pé enquanto tentavam agarrar um corrimão.
O DC-3 estava mais para “avião do terror”... Kapuscinski via que ele expelia fogo e fumaça pelo céu de Honduras ao mesmo tempo em que realizava “manobras cambaleantes”. Todos se sentiam incomodados também com o vento que entrava pelas falhas da fuselagem.
Antonio Rodriguez, jornalistas da EFE, dizia que tinham de torcer para que os barulhentos motores não pifassem em pleno ar.
(...)
Um
caminhão militar levou os jornalistas até a caserna, que fora instalada numa
fortaleza espanhola dos tempos coloniais...
Eles
passaram por três prisioneiros que eram interrogados no pátio. Os tipos estavam
feridos e sofriam pressões do interrogador. Eles pronunciavam frases
inaudíveis... Um deles, ferido na barriga, não suportou a perda do sangue e
tombou ali mesmo.
O
comandante não sabia o que fazer com aquele bando de jornalistas
estrangeiros... Tinha motivos para se preocupar porque acreditava que a
qualquer momento seriam atacados... Ordenou que lhes dessem camisas militares e
que lhes servissem café.
(...)
O
lugarejo fica no caminho entre os dois oceanos (o Atlântico e o Pacífico), e
podia ser considerado local estratégico para salvadorenhos e hondurenhos em
guerra. Apoderar-se do lugar significava, para El Salvador, tornar-se “uma
potência de dois oceanos”.
De
fato, a campanha salvadorenha evoluía por aquele caminho... Eles ambicionavam
conquistar importantes logradouros (Ocotepeque, Santa Rosa, San Pedro Sula,
Puerto Cortes)... Suas tropas haviam avançado consideravelmente e pelo rádio
era possível ouvir suas transmissões que, animadamente, empolgavam seus
soldados e povo: “Alguns gritos, algumas surras; e não haverá mais Honduras”.
(...)
Kapuscinski registra que Honduras era o lado “mais
fraco e pobre”... Na caserna observava os oficiais ordenando a partida de
unidades ao front. Os soldados eram muito jovens e tinham o rosto moreno
assustado... Lembravam índios uniformizados... Demonstravam ao seu modo
necessária determinação para o combate.
Os garotos não partiam sem
a benção do sacerdote que aparecia no instante derradeiro para dizer umas
orações e aspergir a água benta.
(...)
Assim que os jornalistas
foram liberados para seguir para o front, Kapuscinski se colocou entre eles.
Partiram de caminhão para uma região de elevada altitude coberta por florestas
tropicais.
Mais de quarenta
quilômetros se passaram até avistarem as primeiras vilas de choupanas queimadas
e abandonadas... O caminhão passou por um grupo de camponeses armados de
espingardas e facões. Levavam roupas e sombreros do cotidiano, além de uns
poucos pertences. Acenaram ao avistarem o caminhão... Mas não há registros de
que tenham trocado qualquer informação com os militares ou os jornalistas.
Conforme
o caminhão avançou, todos puderam ouvir os tiros das artilharias... O veículo
parou um pouco mais à frente, onde havia uma “clareira triangular”. Ali acomodavam
os feridos que retornavam do combate.
As acomodações eram
precárias... Alguns estavam em macas e muitos outros aguardavam atendimento
deitados na relva... Não havia médicos no local, então dois enfermeiros
procuravam prestar o atendimento básico.
Kapuscinski ficou
impressionado com a calma dos feridos... Entre eles não havia quem reclamasse
das dores ou exigisse auxílio.
Alguns soldados serviam água aos pobres
coitados... Um dos enfermeiros percorria os que estavam com balaços incrustados
pelo corpo e, de lanceta na mão, fazia as incisões para retirá-las. De acordo
com o polonês, fazia isso “como se extrai o caroço de uma maçã”... O outro
enfermeiro chegava para despejar iodo na ferida e cobri-la “com um curativo
rudimentar”.
Leia: A
Guerra do Futebol. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto