Cabisbaixo, Francolim havia listado os animais com os quais podiam contar para o serviço do dia e acrescentou que o grupo era suficiente. Mas no mesmo instante o patrão o advertiu... Será que ele andava “analfabeto”? Precisava pensar um pouco mais...
Então o moço se lembrou do cavalo preparado “de silhão” (sela grande e adaptada para as mulheres e seus trajes longos) que era utilizado por dona Cota (Maricota)... Além desse havia o jovem poldro, mas salientou que este ainda não estava domado.
O Major Saulo foi incisivo ao garantir que também o poldro faria parte da expedição... Francolim admitiu que, se era assim, tinham todas as montarias necessárias.
O patrão pediu que ele contasse nos dedos, pois, além deles dois, seriam necessários mais dez.
Depois de fazer os cálculos, o rapaz concluiu que estava faltando um cavalo.
Então o patrão respondeu que Francolim acertara “depressa demais”.
(...)
O Major Saulo dirigiu-se
à porta e olhou para os ponteiros do relógio da parede da sala...
Neste mesmo momento,
Maria Camélia apareceu trazendo cafeteira e caneca... O patrão quis saber se a
bebida estava bem quente, do jeito que os mais velhos apreciam... Ela confirmou
que estava “de pelar”. Então o Major Saulo sorveu um bom gole, alisou a barriga
e deixou escapar o sorriso “calibrado ao seu humor de momento”.
A negra Maria e o
Francolim também sorriram, mas logo se sentiram incomodados e voltaram a
silenciar. O patrão ordenou que ela entregasse o resto do café ao peão, porém
acrescentou que não devia soprar, pois não era para arrefecer a bebida.
(...)
O patrão levou um
cigarro à boca e posicionou-se no parapeito da varanda... Olhou na direção dos
currais e pronunciou o que estava pensando naquele momento... Era “gado para
encher dois trens”! E ainda havia as vacas que ficariam no arraial. O momento
não era apropriado para a retirada porque a chuvarada estava para cair. Por
outro lado reconhecia que era melhor que chovesse logo, pois depois viria uma
estiagem para dar-lhes folga no percurso.
O Major estava mergulhado em suas reflexões quando notou que o burrinho
se acomodara nos pilares que sustentavam a varanda. O homem sorriu, referiu-se
ao Sete-de-Ouros como se estivesse lidando com um de seus compadres e disse
que, mesmo velho, ele ainda podia aguentar uma viagem “vez em quando”.
Na sequência disse que o Francolim devia colocar arreios também no
burro.
O rapaz disse um “sim senhor”, mas quis saber se
o patrão estava falando sério ou se estava a gozar do pobre animal... O Major
deu a entender que não estava para brincadeiras e soltou sua risada característica.
Sete-de-Ouros cerrou
os olhos... Decerto o desgosto tomou conta de seu ser.
(...)
Francolim argumentou que o burrinho estava “pisado” e sequer enxergava
direito... O patrão discordou e parou para pensar enquanto remexia o dedo no
nariz... Por fim pronunciou que eram apenas quatro léguas... O burro podia
carregar o mais leve dos homens, que era o João Manico.
Depois o patrão
deu-se por satisfeito com as próprias conclusões e sorriu mais uma vez... Então
deu ordem para que o Francolim se retirasse para que não perdesse mais tempo.
(...)
Maria
Camélia também retirou-se no mesmo instante para a cozinha, onde já chegou
contando as novidades às companheiras de labuta (“três meninas, quatro moças e
duas velhas”)... Os cachorros e gatos que frequentavam o local entravam e
saíam, mas as mulheres só tinham assunto para o disparate... Riam também ao
imaginarem o João Manico tocando a boiada montado no burrinho... Mas não era
uma graça?
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2018/04/o-burrinho-pedres-conto-de-sagarana-de_4.html
Leia: O
Burrinho Pedrês – conto de Sagarana. Editora José Olympio.
Um abraço,
Prof.Gilberto