Raimundo estava chegando...
Francolim pediu para o major confirmar com ele a história que havia lhe contado.
(...)
O
Major Saulo pediu ao Raimundo que emparelhasse o cavalo ao seu... Na sequência
perguntou o que ele tinha achado das “topadas do Badú”.
Raimundo elogiou a
firmeza do outro. O major emendou que o marruaz era mau mesmo e cogitou que talvez
ele fosse um dos últimos de uma leva que tinha vindo do Pompéu (localidade ao
sul das nascentes do São Francisco).
O
patrão começou a sondar a opinião do vaqueiro... Disse que o boi era bruto e
perguntou se ele não vira o Silvino assoar o nariz com um lenço vermelho.
Raimundo respondeu que isso simplesmente não era possível... “Não é capaz, seô
Major”... E justificou garantindo que nenhum dos vaqueiros andava com lenço
daquela cor.
Major Saulo concordou
que aquela era uma “regra boa”... Sentenciou que “vermelho é cor de dor de
cabeça” e que pretendia cavalgar mais ligeiro para assistir melhor a tocada do
gado. Ele ainda quis saber se Silvino havia sido enfrentado pelo boi bravo
mesmo estando a cavalo.
Raimundo respondeu
que não tinha visto... Não sabia se algo havia ocorrido antes da topada de Badú
com o boi fera. Sustentou que Marruaz como aquele podia aprontar a qualquer
momento, à traição. De sua parte, o teria topado no pescoço... Mas Badú se saiu
bem e era verdade que “cada um tem uma maneira”...
(...)
O patrão quis saber
se o Raimundão (ele era assim chamado pelos companheiros) se lembrava da
primeira topada de sua vida... O rapaz respondeu que se lembrava de que havia
sido com um boi atarracado e que atacava de olho aberto como as vacas. Disse
que o patrão sabia bem que aquele tipo de animal era dos piores para escorar.
A respeito dessa primeira
experiência, Raimundo explicou que seu pai era vaqueiro dos antigos e achou que
aquele era um bom dia para experimentá-lo. No final deu tudo certo e ele só
tinha a agradecer a Deus.
O patrão quis saber mais e perguntou ao Raimundo se ele se lembrava de
ter pensado algo, se sentiu algo, no momento em que topou um boi bravo pela
primeira vez... O rapaz disse que no primeiro momento pensou que jamais tinha
visto animal maior, mas depois seu corpo passou a agir por si... E arriscou a
dizer que até a vara com o ferrão parecia se governar em momentos como aquele.
Para ele, havia sido algo natural... O enfrentamento durou pouco e logo
o pai chegou junto dele para lhe oferecer um cigarro que ele mesmo havia
enrolado para o filho. Foi a primeira vez que pitou na frente do pai.
Raimundo jamais esquecera as palavras do velho: “Meu
filho, tu nasceu para vaqueiro, agora eu sei”...
(...)
O Major Saulo aprovou
a história contada pelo vaqueiro... Elogiou os gestos e palavras do pai do
rapaz e perguntou se, depois da primeira topada e boa acolhida do velho, ele
não sentira as pernas tremer.
Raimundo respondeu que não e que, em vez disso, sentiu muita fome. Lembrou
que o olho passou a piscar mais do que o normal e de ter afundado a cabeça na água
fria... Durante o resto do dia a imagem
do boi não saiu de sua consciência... Parecia um retrato permanente! A cara
larga, bicho de sete anos, graúdo e “com os cinco anéis no pé do chifre”...
(...)
A
conversa também estava servindo para o Major Saulo descobrir se de fato havia
desavenças entre Silvino e Badú... E se era caso de tomar providências
mais drásticas, como Francolim vinha sugerindo.
Mas, como podemos
notar, ele não foi direto ao assunto... Sentenciou que o início da profissão de
vaqueiro do Raimundo tinha sido muito bom e que ele dava muito valor aos
vaqueiros. Apreciava as histórias de suas vidas, gostava de ouvi-las...
O
major gabou-se ao dizer que o seu pessoal era “gente escolhida”. Raimundo
respondeu que aquilo era bondade do patrão...
O homem fez questão
de garantir que sua conversa era na lei... Com isso quis dizer que não tinha
motivos para não dizer a verdade... Emendou que seus peões nunca lhe davam
trabalho e que em raríssimas ocasiões um ou outro queria lhe “saudar com a mão
canhota”.
Por
fim referiu-se à “história de Silvino com Badú” e perguntou se Raimundo achava
que a briga dos dois poderia “arruinar”.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2018/04/o-burrinho-pedres-conto-de-sagarana-de_22.html
Leia: O
Burrinho Pedrês – conto de Sagarana. Editora José Olympio.
Um abraço,
Prof.Gilberto