Finalmente alguém entendeu que o que estava assustando os cavalos não era nenhum pássaro... Eles estavam receosos do caminho por causa da enchente!
Os homens custaram a crer... Talvez o excesso de bebida alcoólica estivesse contribuindo para a confusão que faziam no caminho escuro. Mas estavam longe do leito do rio e por isso não entendiam como as águas pudessem chegar àquele ponto.
A chuva havia sido intensa... A verdade é que toda aquela região se tornou alagada e muito perigosa para os vaqueiros. Um deles observou que a friagem do local era “de beira de rio”. Os demais concordaram.
(...)
O córrego da Fome estava
distante... Um dos homens concluiu que a baixada devia ter virado uma lagoa
só... Leofredo disse que os cavalos só estavam “fazendo manha”.
Alheio aos problemas dos
humanos, o pássaro continuou com seu canto sinistro “joão-corta-pau!
joão-corta-pau!”
Leofredo sugeriu que os que
estavam mais atrás dessem com as esporas nos animais para tirar-lhes a preguiça.
Juca foi dos primeiros a aprovar a ideia, mas foi interrompido por Silvino, que
deu a ideia de esperarem o Badú, que vinha mais atrás montado no burrico.
Um dos vaqueiros disse que
“seria divertido”... Mas logo foi corrigido por outro que explicou que “burro
não se mete em lugar de onde ele não consegue sair”... Dessa maneira, seria o
Sete-de-Ouros que resolveria a situação: se ele entrasse na água todos o
acompanhariam sem receios.
Finalmente os homens
estavam chegando a um consenso... O que o burrinho fizesse todos fariam.
Mais uma vez ouviu-se o
canto do joão-corta-pau no meio do mato.
(...)
Francolim deu o seu voto
garantindo que estava na posição de quem tem “o dever da continência” por
representar o patrão entre os homens.
Sinoca disse que o outro devia “tirar a colher do tacho”, pois a hora
não era “para palhaçada”. Francolim respondeu que o Major devia ser respeitado,
pois havia sido ele mesmo que o encarregara de “tomar conta e determinar” o que
fosse necessário no retorno à Tampa.
Novamente houve protesto... Talvez tenha sido o próprio Sinoca a dizer
que aquilo não passava de “bestagem”.
Mais uma vez ouviu-se o canto do joão-corta-pau
no meio do mato.
(...)
Depois de algum tempo os
homens notaram a chegada de Badú...
Passaram a gritar para ele se apressar. O rapaz continuava muito
embriagado, mas parece ter despertado ao notar os companheiros mais à frente e
disse que estava a caminho... Tratou-os por “meus parentes” e brincou ao se
referir a eles como “injúrias-peladas de vaqueiros sem boi nenhum”.
Mas ele cuidou de abraçar com
firmeza e ternura o pescoço do burrico.
Enquanto chegavam
vagarosamente, Badú conversou com o Sete-de-Ouros... Ao pé do ouvido do
burrinho, disse: “Eh, meu velho, coitado, que trapalhada! Estou doente, dei na
fraqueza, com este miolo meu zanzando, descolado da cabeça... Muito doente...
Estou com medo de morrer hoje... Mas, se você fosse mais leve, compadre, eu era
capaz de te carregar!”
(...)
Os homens comentaram que
Badú estava chegando “bêbado como gambá”.
Mesmo na escuridão,
Francolim percebeu que Silvino se aproximou de seu desafeto... O advertiu e
disse que não consentia a aproximação. Reclamou que os dois estavam brigados e
não era direito chegar no adversário que estava caindo de bêbado.
Silvino reclamou... Gritou
que Francolim devia calar a boca... Xingou-o e avisou que ele devia deixá-lo,
pois ia aonde bem queria.
Francolim redarguiu que não adiantava o rapaz bufar porque suas palavras
eram “de paz” e, além disso, estava “na lei” em nome do patrão.
Mais
uma vez ouviu-se o canto do joão-corta-pau no meio do mato.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2018/05/o-burrinho-pedres-conto-de-sagarana-de_49.html
Leia: O
Burrinho Pedrês – conto de Sagarana. Editora José Olympio.
Um abraço,
Prof.Gilberto