Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/10/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir.html
antes de ler esta postagem:
Perron quis saber das
conclusões a que Dubreuilh havia chegado com o seu esforço ao escrever sobre
cultura e a condição do intelectual... Foi com ironia que ele mesmo completou
que os questionamentos do amigo serviam para indicar que “a literatura conserva
um sentido”...
Robert percebeu o desprezo de Henri, mas não deixou de adverti-lo sobre
a sua desistência literária e garantiu que não entendia por que ele havia
abandonado o seu projeto... Sobre isso, Perron garantiu que o amigo tinha a sua
parcela de culpa, pois ele havia feito a “apologia da ação”, e isso o levou a “perder
o gosto da literatura”... Disse isso e pediu mais meia garrafa de cerveja ao
garçom.
O assunto rendeu. Robert quis
explicações... Henri disse que suas “historiazinhas” ou o seu pensamento pouco
interessariam ao povo, que nada teria a ganhar com a publicação de um romance
com esse tipo de registro... O moço garantiu que “a grande história não é
assunto de romance”.
Robert ouviu as explicações de Perron e as rebateu,
dizendo que todos possuem “historiazinhas” que não importam a ninguém... Mas
argumentou que aqueles que “sabem contá-las” não devem abrir mão disso porque, escrevendo-as,
contribuem para que os demais se enxerguem nelas... Assim, a literatura que
Henri desprezava devia ser do interesse de todos.
Henri garantiu que pensava daquela maneira ao iniciar o seu livro. Mas
desanimava-se com o fato de a experiência pessoal ser marcada
(predominantemente) por “erros e miragens”. Disse isso enquanto bebericava e
observava dois velhos que jogavam gamão na “paz que reinava no café”...
Como Robert insistia em entender a sua opinião, Henri
deu o exemplo da sensação agradável que temos ao contemplar a beleza das pequenas
luzes refletidas na água numa noite aprazível... A visão é bonita e nos
contentamos com ela... Mas ao reconhecermos que aquelas são luzes que iluminam
os bairros carentes, onde pessoas morrem de fome, a poesia se perde...
Henri levou em consideração que Robert poderia argumentar que isso não
devia ser motivo para abandonar o livro, já que poderia escrever sobre os que
morrem de fome... Então concluiu dizendo que essa temática ele dissertava em
seus artigos para o jornal, ou discursava em um meeting.
Dubreuilh respondeu que as citadas luzes “brilham para todos”...
Concordou que todos devem ter possibilidades de se alimentar... Mas acrescentou
que a sobrevivência deve ter “enlevo”... Então não se pode simplesmente tirar
das pessoas as “pequenas coisas” que a literatura tem condições de retratar.
Robert quis finalizar dizendo que se o procedimento a se adotar fosse
com base nas conclusões pessimistas de Henri, sequer viajariam... Pois as
paisagens seriam vistas (apenas) como ilusões que escondem as mais variadas
injustiças... Henri disse que o momento que viviam demandava registros mais
importantes...
Dubreuilh se irritou e desabafou dizendo que, daquela forma, a esquerda
se condenaria a uma “literatura de propaganda”... O outro se defendeu dizendo
que não se sentia afetado pela tendência aludida.
Para Robert Dubreuilh, Henri deveria demonstrar
disposição para “outra coisa” (referia-se à produção literária)... Garantiu que
o melhor para ele era “manter-se ocupado”. Referindo-se mais uma vez às “pequenas
luzes” do exemplo utilizado por Henri, ele falou que é claro que não se pode
chegar a elas apartando-se completamente de seus significados... Isso
equivaleria a agir como os salafrários... Então sugeriu que Henri Perron
encontrasse um modo de falar sobre as injustiças sem cair no “modelo” dos de
direita... E advertiu que excluir as “experiências pessoais” das produções
literárias equivaleria a “empobrecer o mundo”. E isso simplesmente não
recolocava as coisas em seus devidos lugares.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/10/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir_30.html
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto