A Febem era um ambiente complicado... Ela acolhia órfãos e menores abandonados por suas famílias desde o começo de suas vidas... Não podemos dizer que esse contingente oferecesse resistências à disciplina imposta pela instituição. Mas entre os internos havia também delinquentes com um histórico de ações muito violentas.
Assim, não é de se estranhar que adolescentes como o João Bosco em 1979 se sentissem receosos ao ingressarem na unidade de Antônio Carlos. Ele nunca se esqueceu das palavras do diretor de sua época, Benjamin Fullin, que fazia questão de deixar claro que seu trabalho consistia na formação de homens de bem, e não de bandidos... Isso dependia em grande parte do próprio interno... Era uma opção que cada um devia fazer.
(...)
Felizmente, o rapaz soube avaliar as
oportunidades oferecidas (havia cursos de mecânica e outros para formar eletricistas,
garçons e chefes de cozinha) e aproveitou a oportunidade que surgiu na banda da
instituição, comandada pelo maestro Nadir. Logo de início, porém, João ficou
decepcionado ao ser escalado para tocar tuba... Ele lembra que na primeira
visita que pôde fazer à irmã Dita, pretendia desabafar a respeito desse seu
descontentamento.
Aconteceu que ao chegar ao internato onde viveu até os
treze anos, deparou-se com José Lauro (panificador que colaborava com a
instituição de Pinheiro Grosso) que também estava de visita à irmã Dita. O
homem antecipou-se fazendo elogios à Febem de Antônio Carlos, sobretudo à sua reconhecida
banda... Disse isso ressaltando que ele próprio gostaria de ser um
instrumentista e que a tuba era o seu instrumento preferido, pois ela
desempenha “papel fundamental no suporte harmônico”. É claro que essas palavras deixaram o rapaz
desconcertado... O encontro serviu para confirmar que ele estava no caminho
certo.
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Também na Febem havia funcionários inescrupulosos que viviam a
atormentar os rapazes com aliciamentos sexuais... O próprio João Bosco revela
que teve de rechaçar um tipo que trabalhava no almoxarifado, que investiu contra
ele em certa ocasião.
Mas isso também foi superado e João Bosco cumpriu seu
tempo de Febem com dignidade. Às vésperas de completar os dezoito anos, e de
deixar a instituição de Antônio Carlos, prestou concurso para a Polícia Militar
do estado. Embora tenha sido aprovado, não pôde ingressar porque não tinha a
idade mínima exigida por estatuto. A Febem permitiu que ele permanecesse até os
20 anos, quando ele e outros egressos da unidade foram aprovados em novo
concurso.
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Junto com os colegas aprovados, partiu para o quartel do 2º Batalhão de
Bombeiros, na cidade de Contagem... O começo não foi dos mais fáceis para eles.
Foi o diretor João R. C. Matta que os apoiou até que recebessem o primeiro
salário... Dois anos se passaram e, já formados no 2º Batalhão, resolveram se
candidatar ao 1º Batalhão de Bombeiros da capital, onde pretendiam substituir
os antigos músicos da banda da corporação.Durante os sete anos seguintes, João Bosco morou no quartel e se alojou
no depósito onde os instrumentos musicais eram acondicionados. Outros três
colegas dividiam a instalação com ele... Aos finais de semana, enquanto eles se
dirigiam às suas cidades de origem para visitar parentes, João permanecia em
meio aos livros.
Em frente ao quartel morava o escritor Roberto Drummond... Um dia os
dois se encontraram numa banca de jornal... João saiu da conversa com o
intelectual levando a indicação da leitura de um livro de Albert Camus, O Primeiro Homem... Essa referência talvez
revele a influência que o levou a se matricular no curso de Filosofia da
Pontifícia Universidade Católica (2005).
(...)
Os anos passaram... João Bosco permaneceu nos
bombeiros, se tornou subtenente e chefe da banda. Casou-se, separou-se, e casou-se
novamente aos quarenta e cinco anos... Nessa mesma época (2011) tornou-se pai
e, sem que soubesse, os músicos da banda, apoiados pelo comandante Edson Alves
Franco, planejaram encontrar dona Geralda.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2014/04/holocausto-brasileiro-genocidio-60-mil_6117.html
Leia: Holocausto Brasileiro. Geração Editorial.
Um abraço,
Prof.Gilberto