Em Nazaré, os estrangeiros avistaram formosas judias que se dirigiam à fonte com seus utensílios de barro... Não vemos Teodorico demonstrar interesse por elas... Não ousou flertá-las... Em vez disso, pensou sobre o cotidiano que remontava a tempos bem mais antigos... A própria mãe de Jesus teria feito caminho como aquele, por entre figueiras, em busca de água... Assim como aquelas mulheres, Maria também devia vestir-se de branco e cumprir alegremente a tarefa de todas as tardes.
Suas reflexões o remeteram a Santo Antonino que, por ocasião de sua romagem à Terra Santa, encheu-se de ternura ao avistar as mulheres em seu trajeto rumo à fonte... E não havia sido ele o santo a vinculá-las à mãe de Jesus? E não havia sido ele que as denominara “virtudes claras, herdadas de Maria cheia de graça”?
Enquanto Teodorico manteve-se convicto em sua neutralidade, o guia Pote animou-se a chamar a atenção delas cantarolando madrigais... Elas apenas sorriam discretamente...
(...)
Chegaram
à parte mais alta de Nazaré...
Passaram por vinhas e
figueiras que abrigavam casebres... Tudo muito humilde... E isso, no
entendimento de Teodorico, combinava bem com o modo de ser Daquele que ensinava
a humildade.
O
vento soprava forte no topo do morro onde haviam se posicionado. Com
solenidade, Topsius reverenciou as planícies. Depois passou a apontar para os locais
de importância religiosa... Teodorico enrolava um cigarro e entediado o ouvia
dizer “Esdrelon, Endor, Sulém, Tabor”...
(...)
O mais eram
paisagens... O Monte Carmelo e sua neve; a poeira que subia das planícies da Pérea;
o azulado Golfo de Caifa; as tristes montanhas da Samaria; e, no céu acima dos
vales, o voo das grandes águias.
Teodorico sentenciou
que a vista era “catita”, e isso parecia sintetizar o que havia a ser dito a
respeito de toda paisagem.
(...)
O caminho desde a Samaria
até Ramá foi de chuva torrencial... O tempo só se tornou claro nas proximidades
da colina de Gibeá. Teodorico registrou que naquela localidade existiu o jardim,
onde, tocando sua harpa, Davi passava o tempo a contemplar a cidade sagrada.
Teodorico lembrou-se da Jerusalém que conhecera no sonho... Que tipo de
visão lhe reservava aquela que se avizinhava? Certamente não seria a mesma das
formidáveis torres que guardavam o suntuoso templo resplandecente “ao sol de
Nizam”... Reconheceria as colinas de Acra (repleta de palácios) ou a de Bezeta
(“regada pelas águas de Enrogel”)?
Não demorou e o velho beduíno que os acompanhava anunciou “EL-Kurds”,
que era como desde muito tempo os árabes chamavam Jerusalém.
Ansioso, Teodorico seguiu firme em sua
montaria... Tremeu quando avistou o vale do Cédron... Nada das imponentes
muralhas “visitadas” durante o sonho! Em vez disso, avistou umas ruínas caducas
e, no seu entorno, um aglomerado de conventos...
(...)
Passaram
pela Porta de Damasco e avançaram pelas lajes da Rua Cristã.
A primeira figura que
viram foi a de um frade gorducho... O religioso seguia pelo caminho tirando
boas tragadas de um cachimbo. Carregava um guarda-sol e um livro de orações que
indicava seu compromisso beato.
Chegaram ao Hotel
Mediterrâneo e logo tiveram uma mostra do que era a “Jerusalém Católica”... No
pátio via-se o “anúncio das Pílulas Holloway” (indicadas para os males do
fígado, do estômago e para o tratamento de disenterias) que destacava um folgado
tipo inglês de olhos claros e com o “Times” nas mãos.
Mais
adiante avistaram uma varanda onde haviam estendido umas “ceroulas brancas com
nódoas de café”... Desde aquele ponto ouviram uma voz fanhosa francesa a
pronunciar “C'est le beau Nicolas, holà!”
Leia: A
Relíquia – Coleção “Biblioteca Universal”. Editora Três.
Um abraço,
Prof.Gilberto